— Oi, Bri! — ela diz com entusiasmo, e me dá uma piscadela provocante.
Patrick fica rodeando, importuno, passando a mão naquele cabelo de plástico bege, oferecendo seu lugar e servindo uma taça do Cabernet Sauvignon búlgaro que eu trouxe com um enorme custo pessoal como se fosse dele. Quando Alice pergunta:
— Você se importa se eu fumar?
Ele responde:
— Claro que não!
Como se, de repente, isso fosse uma ótima ideia. Por que ele não pensou nisso antes? Olha ao redor procurando alguma coisa para usar como cinzeiro e localiza um pequeno porta-clipe, que esvazia na mesa com um desapego selvagem e anárquico.
Alice se espreme ao meu lado no sofá, o quadril bem junto ao meu. Patrick limpa a garganta e se dirige à equipe.
— Então, aqui estamos nós! O Quarteto Fantástico! E acho que temos algo especial esse ano...
Espere um segundo — Quarteto Fantástico?
— Só para explicar como as coisas funcionam...
Conto as pessoas na sala; um, dois, três...
— ...o primeiro estágio é nos classificarmos para a competição televisionada...
Por que não dizer Famous Five? Não custava nada ele ter dito Famous Five.
— Isso é daqui a duas semanas e é informal, mas bem difícil. Por isso, vamos precisar de todo nosso conhecimento para ir ao ar. Até lá, proponho que nós quatro nos encontremos aqui toda semana, nessa mesma hora, para repassar algumas questões que vou preparar. Talvez assistir a uma ou duas fitas, só para manter a concentração...
Espere um segundo — por que eu não posso vir? Se eu não vier, não vou poder ver Alice. Levanto a mão para fazer uma pergunta, mas Patrick está pondo uma fita no vídeo e não vê; eu limpo garganta e digo:
— Hã... Patrick...?
— Brian?
— Então, não preciso vir?
— Acho que não...
— De jeito nenhum...?
— Não...
— E você não acha que é uma boa ideia...?
— Bem, só vamos precisar de você em caso de emergência. Acho que é melhor nós quatro nos acostumarmos uns com os outros como uma equipe, já que, como você sabe, nós somos a equipe.
— Então vocês não precisam de mim?
— Não.
— Nem mesmo, sei lá, para fazer observações...?
— Não, Brian, não... — e aperta botão play no vídeo. — Muito bem. Esse é Leeds versus Birkbeck, nas quartas de final de dois anos atrás. Um belo confronto... — ele se senta outra vez no sofá, com Alice espremida entre nós dois, o quadril bem junto ao meu, enquanto eu tento bolar um plano para assassinar Patrick Watts.
10
PERGUNTA: Qual é o significado do lema, em latim, que acompanha o leão rugindo no começo dos filmes da Metro-Goldwyn-Mayer?
RESPOSTA: Ars Gratia Artis — Arte pela arte.
— Bem, pessoalmente, tenho que dizer que simplesmente odeio isso. Quer dizer, a ideia de que seja um grande poema lírico de amor é bobagem. É só o poema de um cara gostosão, imbecil e sexualmente frustrado tentando ir para a cama com a amante e insistindo sobre uma carruagem alada do tempo e não aceitando não como resposta. Não há nada de lírico ou romântico, e tampouco nada de erótico nesse poema. Pelo menos, não para uma mulher — discursa Erin, a amiga de Alice, a garota com olhos de gato e cabelo curto louro e oxigenado. — Na verdade, se um cara me mandasse esse poema ou o recitasse para mim eu chamaria a polícia. Não me espanta que a tal amada seja tão evasiva. O poeta é um misógino total.
— Você acha que Andrew Marvell é misógino? — pergunta o professor Morrison, recostando-se em sua cadeira, os longos dedos da mão entrelaçados em cima da sua barriga.
— Basicamente, sim. Pelo menos, nesse poema, com certeza.
— Então, a voz do poeta e a voz do poema são uma só?
— Porque não deveriam ser? Nada sugere qualquer tipo de dispositivo de distanciamento...
— O que você acha, Brian?
Para ser sincero, estou, na verdade, pensando em Alice. Então, paro por um segundo e esfrego minhas orelhas para ganhar tempo, como se minhas faculdades críticas estivessem por alguma razão nos meus lóbulos e eu precisasse aquecê-los. É só a minha terceira aula, e fui pego na última por fingir ter lido Mansfield Park quando, na verdade, só assisti à metade do primeiro episódio na TV. Então, é melhor me sair melhor agora. Do meu arsenal, seleciono o termo contexto histórico.
— Acho que é mais complicado que isso, em especial se considerarmos o poema no seu contexto histórico...
Erin estala a língua e suspira, como tende a fazer sempre que abro a boca nas aulas. Erin claramente me odeia, mas não sei o motivo, porque estou sempre sorrindo para ela. A não ser que seja esse o motivo. Bem, concentre-se.
— Para começar existe um forte elemento humorístico aqui. O uso da retórica é consciente e, nesse sentido, é um pouco como o soneto 130 de Shakespeare: Não tem olhos solares, meu amor... (muito bom)... Só que aqui a retórica do poeta o faz passar por bobo. O desespero, os extremos a que chega para persuadir a amante a sucumbir faz dele uma figura essencialmente cômica. É a comédia da frustração sexual e da humilhação romântica. É, na verdade, o epônimo amada evasiva, o objeto de sua não requerida paixão, que tem todo o poder no caso...
— Bem, isso foi um monte de bobagens reacionárias e chauvinistas — vocifera Erin, que ficou se remexendo na cadeira o tempo todo, fazendo o assento de vinil ranger de indignação. — A amada evasiva não tem poder, e também não tem nenhuma personalidade, é só uma cifra, um branco, definida apenas por sua beleza e sua relutância em dar para o poeta. E o tom claramente não é cômico, nem lírico, é intimidador, manipulador e opressivo.
Então, Chris, o hippie de mãos sujas, começa a falar e decido deixar Erin usá-lo como seu esparro em meu lugar por enquanto. O professor Morrison me dá um olhar paternal, informando-me que estava concordando comigo o tempo todo. Gosto do professor Morrison. Tenho medo dele também, o que, provavelmente, é a combinação certa para um acadêmico. Ele é meio parecido com David Attenborough, o que também deve ser uma boa coisa num acadêmico. Usa muito veludo cotelê, gravatas tricotadas, é magro feito um palito, tirando a pancinha, que parece uma almofada amarrada debaixo da camisa suja. E sabe ouvir com atenção quando você está falando, a cabeça meio inclinada, com os dedos longos nos lábios, exatamente como os intelectuais na TV.
Enquanto Erin esfola Chris vivo, e o professor Morrison assiste, divago um pouco e olho pela janela para o jardim e volto a pensar em Alice, de novo.
Voltando da aula pela rua principal, vejo a tal Rebecca e os malditos ativistas raivosos com quem ela sempre anda. Estão enfiando panfletos nas mãos de consumidores indiferentes e, por um momento, penso em atravessar a rua. Para ser honesto, estou um pouco na defensiva com ela, em especial depois da nossa última conversa, mas fiz uma promessa a mim mesmo de fazer o maior número possível de novos amigos na faculdade, mesmo que eles deem todas as indicações de não gostarem de mim tanto assim.
— E aí? — interpelo.
— E aí, Rainha da Dança?! Como vai? — responde ela, entregando-me um folheto pedindo para boicotar o Barclays.
— Na verdade, o dinheiro da minha bolsa está em outra gentil e humanitária organização bancária multinacional! — digo, com um brilho incisivo, irônico e satírico no olhar, mas ela não está prestando atenção e já voltou a distribuir panfletos, gritando: