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— E aí, Spencer?! — diz Chris.

— …E essa é Ruth... — acrescento.

— Na verdade, meu nome é Mary — diz Mary, virando-se e sacudindo as pontas dos dedos de Spencer. — E aí, Spencer, é mesmo um prazer conhecer você... — chegando para o lado e dando um tapinha no chão, abrindo caminho, obrigando-nos a participar do círculo.

Chris passa o baseado para uma garota superpequena de nariz arrebitado com o cabelo preso para trás com uma faixa como a de Alice, encostada na cama com as pernas dobradas perfeitamente por baixo do corpo. Não sei o nome dela, mas a reconheço como a primeira esposa de Ricardo III, Lady Anne, e me recordo vagamente de um rumor segundo o qual ela é lady de verdade na vida real, e que um dia vai herdar boa parte de Shropshire. Ela pega o baseado e dá uma tragada majestosa, antes de passar para nós:

— Garotos?

— Saúde! — diz Spencer, e dá uma tragada profunda, o que é estranho, pois, em geral, ele só bebe e fuma cigarros, e costuma ser bem desdenhoso com maconheiros. — Então, sobre o que vocês estavam conversando? — pergunta.

— Índia! — respondem todos, em uníssono.

— Já esteve lá, Spencer? — pergunta Chris.

— Não, não posso dizer que estive... — responde, prendendo a respiração.

— Está tirando um ano de folga, então? — pergunta Mary/Ruth.

— Não exatamente — diz, exalando devagar.

— Então, onde você está estudando? — pergunta Chris.

— Não estou estudando — responde Spencer.

— No momento! — acrescento, alegre, e Spencer me lança um olhar e abre um sorriso de crocodilo antes de dar outra tragada ainda mais funda no baseado e passar para mim.

Eu pego, ponho na boca, tusso, tiro e passo adiante, e aí há uma breve pausa, enquanto as pessoas ficam ouvindo Van Morrison tocando e eu tossindo. Depois, Lady Anne subitamente se ajoelha e fala de maneira embaralhada.

— Já sei! Vamos jogar E se essa pessoa fosse...!

— E o que é isso? — questiona Spencer, soltando a fumaça devagar.

— Bem, a gente escolhe uma pessoa, depois sai do quarto e, então, a pessoa... Não, não está certo, não. Nós escolhemos uma pessoa pra sair do quarto e, depois, as pessoas dentro do quarto escolhem outra pessoa e a pessoa fora do quarto volta pra dentro e tem que passar pelo círculo fazendo para cada pessoa perguntas como... Hã... Se essa pessoa fosse um clima, qual clima seria? e a pessoa tem de responder alguma coisa como essa pessoa seria..., referindo-se a quem nós escolhemos secretamente, ... seria alegre como um dia ensolarado! ou uma trovoada pesada! ou coisa assim. Tem que personificar essa pessoa dependendo da maneira como a veem. E, então, a pessoa que saiu do quarto pergunta para a próxima se essa pessoa fosse um peixe, ou uma roupa íntima, digamos, que tipo de peixe ou roupa íntima ela seria?, e essa pessoa... — Ela continua explicando, lenta e detalhadamente, as regras de E se essa pessoa fosse..., pelo que parecem uns dois ou três dias, dando-me tempo suficiente para olhar para Spencer, sentado com a mandíbula relaxada, parecendo atordoado e confuso e sorrindo em silêncio para si mesmo. Escuto um ruído, olho para baixo e percebo que estou esmagando a lata de cerveja com a mão. Decido tirar a gente dali...

— Vem, Spencer, vamos pegar uma bebida — sugiro, agarrando seu braço e puxando-o para cima.

— Ah, vocês não querem jogar? — suspira Ruth, ou Mary.

— Talvez mais tarde. Estamos precisando de uma bebida — respondo, levantando minha lata de cerveja cheia. Empurro Spencer, fecho a porta e, graças a Deus, saímos do quarto e seguimos para a escada.

— Mas eu quero jogar! — reclama Spencer, dando risinhos atrás de mim.

Olho de volta e ele está se equilibrando apoiado numa parede, sorrindo e parecendo meio zonzo. Resolvo fingir que preciso usar o banheiro, aponto para a porta no patamar da escada e me escondo.

Dentro do banheiro, eu me recosto na pia e olho no espelho para o grande presunto cheio de bolhas que se passa por um rosto e me pergunto por que Spencer sempre tem que estragar tudo. Adoro Spencer, mas odeio quando ele fica desse jeito, bêbado e maldoso. Bêbado e sentimental tudo bem, mas bêbado e maldoso é de dar medo. Não que ele fique violento, a não menos que seja provocado, mas tenho que fazer com que ele pare de beber, mas não sei como fazer isso a não ser arrancando a bebida da sua mão. Poderíamos até ir embora, mas, se eu não falar com Alice, vai demorar muitos dias até a reunião da equipe na semana que vem, e não posso mesmo esperar tanto tempo. O fato é que estou achando muito difícil ser Devastador e Distante com Spencer ali.

E o pior de tudo é que preciso pensar num modo de dizer que ele tem de ir embora no dia seguinte. Claro que, enquanto eu continuar ali trancado, não tenho de lidar com nenhuma dessas coisas, porém alguém bate na porta. Então, dou descarga e percebo que a pessoa que usou o banheiro antes de mim conseguiu fazer xixi em todo o assento preto de plástico do vaso. Penso em limpar, chego até a fazer uma bola de papel higiênico, mas decido que limpar o xixi de outra pessoa é exatamente o tipo de comportamento servil e degradante que venho tentando evitar com afinco, e, além do mais, isso não é minha responsabilidade, não mesmo. Lembre-se: Devastador e Distante. Dou a descarga e saio.

Alice é a próxima na fila.

Ela está na porta, conversando com Spencer e rindo muito.

— Olá, Brian! — cumprimenta, alegre.

— Não fui eu quem fez xixi no assento do vaso — digo, Devastador e Distante.

— Ótimo, Brian, é bom saber disso! — responde ela, antes de entrar e fechar a porta.

29

PERGUNTA: Em que peça de 1594 os velhos amigos Proteus e Valentine brigam por causa do amor da beata Silvia?

RESPOSTA: Os dois cavalheiros de Verona.

— Então... Vocês andaram conversando? — pergunto a Spencer.

— Uh-hum.

— Ela é legal, né?

— É, ela parece legal. Muito sensual... — comenta, olhando de esguelha para a porta do banheiro.

— Mas não é interessante também?

— Bem, Bri... Nós só conversamos cinco minutos, mas, com certeza, não fiquei entediado. Não com ela naquela malha justa...

— Sobre o que vocês falaram, então? Quer dizer, ela falou alguma coisa? Sobre mim...?

— Bri, fica frio, cara. Ela gosta de você, mas não force a barra...

— Você acha?

— Tenho certeza.

— Certo. Vou até a cozinha. Você vem...?

— Não, eu vou esperar — e aponta a porta do banheiro com a cabeça. Tomo o caminho para o andar de baixo e, só quando chego na metade, começo a me perguntar o que ele quis dizer com vou esperar. Esperar para usar o banheiro ou esperar Alice?

Do nada, uma ideia começa a se formar na minha cabeça, e logo assume a solidez de fatos irrefutáveis: Spencer está dando em cima dela. Veio de tão longe para seduzir Alice! Depois de me ouvir falar a respeito, ele deve ter pensado: gostei dessa história. Vou querer um pouquinho. E, afinal, não seria a primeira vez — é o fiasco da Janet Parks se repetindo mais uma vez. As garotas de quem eu gosto sempre gostam de Spencer Lewis, e o fato de ele não dar a mínima só aumenta a atração. Por que isso? O que ele tem que eu não tenho? Ele é bonito, acho. Mesmo sendo heterossexual, consigo fazer uma avaliação objetiva e dizer que ele é bonito e cheio de mistério; é convencido, irresponsável, não muito asseado, todas essas coisas das quais as mulheres fingem que não gostam, mas, obviamente, gostam. E, tudo bem, ele não é Chique, mas é Maneiro, e Maneiro ganha de Chique aos olhos de Alice Harbinson, da mesma maneira que a tesoura ganha do papel. Claro... Agora, dá para entender tudo... Claro como o dia! O canalha está dando uma de Heathcliff para cima de mim. Enquanto estou pensando nisso, aposto que a mão dele já está entrando na malha dela e...