Epílogo
Pouco saber é algo perigoso
Beba das profundezas,
ou o aroma de Pieria ficará perigoso
Suas gotas ralas intoxicam a mente
Mas seu pleno sorver nos faz sóbrios novamente.
I know that something good is going to happen
And I don‘t know when,
But just saying it could even make it happen.[1]
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PERGUNTA FINAL: Com 240 quilômetros de comprimento de leste a oeste, a maior das ilhas gregas, cujo centro administrativo é Heraklion, que ilha do Mediterrâneo foi berço da primeira civilização europeia, a dos minoicos?
RESPOSTA: Creta.
12 de agosto de 1986
E aí, como vai!
Como vai? Aposto que isso é uma surpresa, depois de todo esse tempo! Sim, o carimbo postal no envelope está correto. Estou mesmo no exterior, pela primeira vez. E num lugar quente! Estou até um pouco bronzeado, mais ou menos, ou vou ficar quando parar de descascar. Como era previsível, eu “exagerei no primeiro dia” e tive muita dor por algum tempo, mas agora estou melhor (minha pele está sem espinhas, mas você não precisa saber disso!!!). Também aprendi a mergulhar com snorkel, apesar dos ataques de pânico. A comida é ótima — muita carne assada, absolutamente nenhuma verdura. Hoje comi meu primeiro pedaço de queijo Feta. Hummm — lembra um pouco salgadinhos de pacote. Lembra aquela vez que fomos ao Luigi e você usou aquele vestido de baile?
Bem...
Seu cartão-postal chegou um pouco antes de partirmos. Foi uma surpresa agradável e também um alívio. Depois de nossa pequena, hã, aventura, pensei que talvez você ainda estivesse um pouco brava comigo. Tem visto Patrick? Ele já se recuperou, ou meu nome ainda está na lama? Mande lembranças minhas, afaste-se e fique observando o rosto dele mudar de cor.
Acho que é uma ótima você fazer o papel de Helen Keller no semestre que vem. Imagino que seja um verdadeiro desafio. Ainda assim, pelo menos você não tem falas para decorar! Foi Noel Coward quem disse que atuar se limita a não bater nos móveis? Ha, ha! Desculpe!!! Não foi engraçado. Sério, parabéns, parabéns mesmo. Você será uma grande Helen. Talvez eu vá até aí ver você no papel, inclusive porque perdi a sua Hedda (como falou certa vez um goleiro com remorso! Sacou? Uma piada futebolística! Ha, ha!) Seria bom ver você novamente, depois de todo esse tempo. Tenho muita coisa para contar...
…Mas, àquela altura, tive que parar de escrever, pois ela está subindo a escada, vindo de seu banho de piscina do fim da tarde, e enfio a carta dentro do livro, me jogo na cama e finjo estar lendo Cem anos de solidão.
Enfim, foi de Julian, o jovem pesquisador, de quem mais senti pena. Pois, para a minha versão fazer algum sentido, tive de envolvê-lo um pouco na história.
Em resumo, o que aconteceu foi o seguinte: enquanto estava deitado na mesa, eu sem querer derrubei a prancheta, a prancheta dele, que ele esqueceu lá no chão quando me levaram lá para cima, e o envelope caiu e abriu, espalhando os cartões de perguntas pelo chão. Naturalmente, assim que percebi que eram os cartões, guardei todos de volta no envelope, mas devia ter notado o que estava escrito em um deles antes de afastar o olhar. Você sabe, meio que subliminarmente.
E até que eles foram bem legais quanto a isso, considerando que tiveram que descartar a gravação e mandar todo mundo para casa. Quer dizer... Não deram uma de Gestapo ou coisa assim, não puseram uma luz na minha cara nem me bateram, porque tecnicamente eu não tinha feito nada de errado. Ao menos, nada pelo que pudesse ser acusado e julgado.
Mas claro que tiveram que desclassificar a equipe inteira. Mesmo eu insistindo que era o único envolvido e que a culpa era inteiramente minha e tudo o mais, eles não podiam arriscar. Então, foi isso. Esse foi o fim do Desafio. Para todos.
E tenho de admitir que tudo foi bem constrangedor. Nem me senti no direito de voltar com o resto da equipe, pois não sabia se me deixariam entrar no carro, e tinha certeza de que não seria bem-vindo no micro-ônibus da torcida. Então, voltei para Southend com minha mãe e Des na caminhonete, espremido no banco da frente. Sabe aquelas cenas que você vê nos noticiários, de criminosos sendo tirados às pressas das delegacias de polícia, escondidos debaixo de uma manta cinza? Bem, foi um pouco assim. Enquanto saíamos do estacionamento, pude ver os outros parados em volta do 2CV amarelo de Alice, com Patrick gritando e chutando os pneus, Lucy tentando acalmá-lo e Alice encostada no carro, ainda naquele maravilhoso vestido preto, com Eddie, O Urso pendurado numa das mãos, muito triste e... tão linda. Nossos olhares se cruzaram quando o carro passou por eles, e ela deve ter dito olhem, lá está ele! ou algo assim, pois todos se viraram, e, bem, não existe uma reação simples a uma situação como essa, não existe uma expressão facial de se adotar. Por isso, só consegui com os lábios a palavra desculpe pelo vidro do carro.
Não tenho certeza se eles viram.
Patrick começou a gritar alguma coisa que eu não consegui entender, olhando em volta em busca de algo para atirar em mim, e Alice só meneou a cabeça, bem devagar.
Mas notei que Lucy acenou, o que achei muito legal da parte dela.
Enquanto ela está dormindo, tirando seu cochilo de fim de tarde, vou até a varanda e olho para o mar, sento-me na mesa de madeira e continuo a escrever.
Desculpe a interrupção. Onde eu estava? Ah, sim, talvez eu pudesse ir aí ver você interpretar Helen Keller, embora seja uma viagem bem longa a se fazer. Veja bem: estou me mudando para Dundee. Consegui uma vaga, começo em outubro. Literatura inglesa de novo, embora aqui eles só chamem de “literatura”. É uma sensação muito boa ter um novo começo e tudo mais. Estou esperançoso quanto ao futuro, e espero me concentrar um pouco mais nos meus estudos dessa vez...
Contei a minha mãe a mesma história que contei para as autoridades, e acho que ela acreditou em mim, embora não tenha comentado muito na hora. Mas, na manhã no dia seguinte, quando enfim chegamos a Southend e subi a escada até o meu antigo quarto, ela disse que não fazia diferença, que estava orgulhosa de mim assim mesmo, e foi legal da parte dela dizer isso, mesmo que não fosse realmente verdade.
Na tarde seguinte, liguei para o setor de inglês e disse que não voltaria na outra semana por causa de uma doença súbita. Mas a notícia já devia ter se espalhado, pois o professor Morrison sequer me perguntou qual era o problema. Disse apenas que entendia perfeitamente, que parecia ser uma boa ideia, que eu ficasse em casa o tempo que quisesse. Passei a maior parte daquela semana dormindo, lendo, sem beber, esperando a poeira baixar.
No entanto, algumas poeiras a gente sabe que nunca vão baixar. Depois de duas semanas sem sair do quarto, decidi que talvez fosse melhor não voltar mais, afinal. Então, Des e eu fomos até lá uma tarde, no carro dele, pegamos as minhas coisas enquanto Marcus e Josh estavam fora e regressamos naquele mesmo dia. Daí, voltei para o quarto e continuei na cama até minha mãe insistir para eu ir a um médico, e, depois disso, as coisas começaram a parecer um pouco melhores.
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Sei que alguma coisa boa vai acontecer/Não sei quando,/Mas só de dizer pode até fazer que aconteça.