Выбрать главу

- O que você acha que ele fez com ela?

- Atirou-a no mar.

- Você viu?

- Não.

Yabu deitou-se novamente e os dedos recomeçaram o trabalho. O pensamento de que mais alguém sabia que a espada não fora quebrada excitou-o estranhamente. Você devia matar Suwo, disse a si mesmo. Por quê? Como poderia um cego reconhecer a lâmina? É parecida com qualquer outra lâmina Murasama, e o punho e a bainha foram trocados muitas vezes, ao longo dos anos. Ninguém pode saber que a sua espada é a espada, que passou de mão em mão com sigilo crescente à medida que o poder de Toranaga foi aumentando. Por que matar Suwo? O fato de ele estar vivo acrescenta um atrativo a mais, estimula você. Deixe-o vivo, você pode matá-lo a qualquer momento. Com a espada.

Esse pensamento agradou a Yabu enquanto se deixava devanear mais uma vez, muito confortavelmente. Um dia, breve, prometeu a si mesmo, serei poderoso o bastante para usar minha lâmina Murasama na presença de Toranaga. Um dia, talvez, contarei a ele a história da minha espada.

- O que aconteceu depois? - perguntou, querendo ser embalado pela voz do velho.

- Simplesmente caímos num período de desgraça. Aquele foi o ano da grande carestia, e com a morte do meu amo, fiquei ronin. - Os ronins eram samurais ou camponeses-soldados, sem terra ou sem amo, que, devido a desonra ou perda do amo, eram forçados a perambular pela terra até que algum outro senhor aceitasse seus serviços. Era difícil para um ronin encontrar novo trabalho. A comida era escassa, quase todos os homens eram soldados, e os estrangeiros raramente mereciam confiança. A maioria dos bandos de salteadores e corsários que infestavam a terra e a costa eram ronins. - Aquele ano foi muito ruim, assim como o ano seguinte. Combati para todo mundo, uma batalha aqui, uma escaramuça ali. Comida era a minha paga. Então ouvi dizer que havia comida em abundância em Kyushu e comecei a me dirigir para oeste. Naquele inverno encontrei um santuário. Dei um jeito para ser contratado por um mosteiro budista como guarda. Combati por eles durante meio ano, protegendo o mosteiro e seus campos de arroz contra os bandidos. O mosteiro ficava perto de Osaka e, naquela época, muito tempo antes de o taicum destruir a maior parte deles, os bandidos eram tão numerosos quanto mosquitos de brejo. Um dia caímos numa emboscada e fui abandonado como morto. Uns monges me acharam e curaram meu ferimento. Mas não puderam me devolver a vista. - Seus dedos se aprofundavam cada vez mais. - Colocaram-me junto de um monge cego, que me ensinou a fazer massagem e a ver de novo com os dedos. Agora meus dedos me dizem mais do que meus olhos diziam, acho.

"A última coisa que me lembro de ter visto com os olhos foi a boca escancarada do bandido e seus dedos macerados, a espada como um arco resplandecente e depois, depois do golpe, o aroma de flores. Vi o perfume em todas as suas cores, Yabu-sama. Isso tudo foi há muito tempo, muito antes de os bárbaros chegarem à nossa terra, cinqüenta, sessenta anos atrás, mas eu vi as cores do perfume. Vi o nirvana, acho, e num momento fugacíssimo, o rosto de Buda. A cegueira é um preço baixo para uma dádiva assim, neh?"

Não houve resposta. Suwo não esperava que houvesse. Yabu estava dormindo, conforme o planejado. Gostou da minha história, Yabu-sama? - perguntou Suwo silenciosamente, divertido como um velho devia estar. Foi tudo verdade, menos uma coisa. O mosteiro não ficava perto de Osaka, mas do outro lado da sua fronteira ocidental. O nome do monge? Su, tio do seu inimigo, Ikawa Jikkyu.

Eu poderia quebrar-lhe o pescoço com tanta facilidade, pensou. Seria um favor para Omi-san. Seria uma bênção para a aldeia. E retribuiria, em minúscula medida, a dádiva do meu benfeitor. Devo fazê-lo agora? Ou mais tarde?

Spillbergen estendeu as hastes de palha de milho, enfeixadas, o rosto retesado.

- Quem quer pegar primeiro?

Ninguém respondeu. Blackthorne parecia estar cochilando, encostado ao canto de onde não se movera. Era quase crepúsculo.

- Alguém tem que pegar primeiro - irritou-se Spillbergen.

- Vamos, não há muito tempo.

Haviam lhes dado comida e um barril de água, e outro barril como latrina. Mas nada com que lavar o lixo fedorento ou com que se limparem. E as moscas apareceram. O ar estava fétido, a terra lamacenta. A maioria dos homens se despira até a cintura, suando de calor. E de medo.

Spillbergen olhou de rosto em rosto. Voltou a Blackthorne.

- Por que você foi eliminado? Hein? Por quê?

Os olhos se abriram, estavam gelados.

- Pela última vez: eu ... não ... sei ...

- Não é justo. Não é justo.

Blackthorne voltou ao devaneio. Deve haver um meio de dar o fora daqui. Deve haver um meio de recuperar o navio. Aquele bastardo vai nos matar a todos no final, isso é tão certo como haver uma estrela do norte. Não há muito tempo, e fui eliminado porque eles têm algum fétido plano especial para mim.

Quando o alçapão se fechara, haviam todos olhado para ele, o alguém dissera:

- O que vamos fazer?

- Não sei - respondera ele.

- Por que você não deve ser escolhido?

- Não sei.

- Que o Senhor Jesus nos ajude - choramingara alguém.

- Tratem de dar um jeito nessa sujeira - ordenara ele.

- Empilhem a imundície ali!

- Não temos esfregões ou...

- Usem as mãos!

Fizeram como lhes ordenou, com ele os ajudando, e limparam o capitão-mor da melhor maneira que puderam.

- Você se sentirá bem agora.

- Como... como vamos escolher alguém? - perguntou Spillbergen.

- Não vamos. Vamos lutar com eles.

- Com quê?

- Iremos como ovelhas para o açougueiro? Você irá?

- Não seja ridículo, eles não me querem, não seria certo que eu fosse o escolhido.

- Por quê? - perguntou Vinck.

- Sou o capitão-mor.

- Com todo o respeito, senhor - disse Vinck ironicamente -, talvez devesse se oferecer como voluntário. Faz parte da sua posição.

- Ótima sugestão - disse Pieterzoon. - Apóio a proposta, por Deus!

Houve um assentimento geral e todos pensaram: Senhor Jesus, qualquer um, menos eu.Spillbergen começara a gritar e a dar ordens, mas viu os olhos impiedosos. Então parou e olhou firme para o chão, nauseado. Depois disse:

- Não. Não... não seria justo que alguém se oferecesse como voluntário. Vamos... nós... vamos tirar à sorte. Palhas, a que for mais curta do que as outras. Poremos nossas mãos... nos poremos nas mãos de Deus. Piloto, você segura as palhas.

- Não. Não quero ter nada a ver com isso. Digo que devemos combater.

- Eles nos matarão a todos. Você ouviu o que o samurai disse: nossas vidas serão poupadas, menos uma. - Spillbergen enxugou o suor do rosto e uma nuvem de moscas se levantou, para pousar de novo.

- Dêem-me água. É melhor que morra um do que todos nós.

Van Nekk encheu a cuia no barril e deu-a a Spillbergen.

- Somos dez. Incluindo você, Paulus - disse ele. - As possibilidades são boas.

- Muito bom, a menos que você seja o escolhido. - Vinck deu uma olhada em Blackthorne. - Podemos enfrentar aquelas espadas?

- Você consegue ir mansinho para o torturador se for o escolhido?

- Não sei.

- Vamos tirar à sorte - disse Van Nekk. - Deixemos que Deus decida.

- Pobre Deus! - disse Blackthorne. - As imbecilidades pelas quais é responsabilizado!

- De que outro modo escolher, então? - gritou alguém.

- Não escolhemos.

- Faremos como Paulus diz. Ele é o capitão-mor - disse Van Nekk. - Tiraremos à sorte. É melhor para a maioria. Vamos votar. Somos todos a favor?

Todos disseram que sim. Menos Vinck.

- Estou com o piloto. Para o inferno com essas palhas imundas!

Vinck acabara sendo persuadido. Jan Roper, o calvinista, conduzira as preces. Spillbergen quebrou os dez pedaços de palha com exatidão. Depois partiu um deles ao meio. Van Nekk, Pieterzoon, Sonk, Maetsukker, Ginsel, Jan Roper, Salamon, Maximillian Croocq e Vinck.