Mariko tentou se concentrar. — E... e o filho dela?
— Ele também, senhora. — A sarcástica risada de Ishido ecoou. — E todos os seus homens.
Yabu gaguejou: — Todos têm salvo-condutos?
— Sim, Kasigi Yabu-san — disse Ishido. — O senhor é o oficial superior, neh? Por favor, vá imediatamente ao meu secretário. Ele está preenchendo todos os passes, embora eu não entenda por que hóspedes de honra desejem partir. Mal vale a pena, por dezessete dias. Neh?
— E eu, senhor general? — perguntou debilmente a velha Senhora Etsu, ousando testar a totalidade da vitória de Mariko, o coração disparado e doendo. — Posso... posso, por favor, partir também?
— Naturalmente, Senhora Maeda. Por que conservaríamos qualquer pessoa aqui contra a vontade? Somos carcereiros? Claro que não! Se a acolhida do herdeiro é tão ofensiva que a senhora deseje partir, então parta, embora eu não compreenda como a senhora pretende viajar quatrocentas ris até casa e outras quatrocentas de volta, dentro de dezessete dias.
— Por favor, desc... desculpe-me, a... a acolhida do herdeiro não é ofen...
Ishido interrompeu gelidamente. — Se deseja partir, solicite uma licença pelas vias normais. Levará um dia ou pouco mais, mas nós a veremos em segurança a caminho. — Dirigiu-se aos outros: — Quaisquer senhoras podem solicitar, qualquer samurai. Eu disse antes: é estupidez partir por dezessete dias, é insultaste desconsiderar a acolhida do herdeiro, a acolhida da Senhora Ochiba, e a acolhida dos regentes... — seu olhar implacável voltou a se fixar em Mariko — ... ou pressioná-los com ameaças de seppuku, o que, para uma senhora, deveria ser feito em particular e não como um arrogante espetáculo público. Neh? Não viso à morte de mulheres, apenas à dos inimigos do herdeiro, mas se mulheres são abertamente inimigas dele, então eu logo cuspirei em seus cadáveres também.
Ishido girou sobre os calcanhares, gritou uma ordem aos cinzentos, e se afastou. Imediatamente capitães ecoaram a ordem e todos os cinzentos começaram a se formar e a mover-se dali, exceto alguns, que permaneceram em honra aos marrons.
— Senhora — disse Yabu, rouco, enxugando as mãos úmidas de novo, um gosto amargo de vômito na boca devido à inconclusão —, senhora, terminou agora. A senhora... ganhou. A senhora venceu.
— Sim... sim — disse ela. Suas mãos sem forças procuraram o nó do cordão branco. Chimmoko avançou, desfez os nós e retirou a manta branca, depois se afastou do quadro carmesim. Todo mundo observava Mariko, esperando para ver se ela conseguiria caminhar.
Mariko estava tentando se pôr de pé às apalpadelas. Não conseguiu. Tentou uma segunda vez. Não conseguiu de novo. Impulsivamente Kiri se moveu para ajudá-la, mas Yabu meneou a cabeça e disse: — Não, é privilégio dela — e Kiri se sentou de novo, mal podendo respirar.
Blackthorne, ao lado dos portões, ainda num turbilhão que a alegria sem limites da suspensão da sentença lhe causava, lembrou-se de como sua própria vontade estivera prostrada naquela noite do seu quase-seppuku, quando tivera que se levantar como homem e caminhar como homem, sem apoio, e se tornara samurai. E observou-a, desprezando a necessidade daquela coragem, embora a compreendesse, até a honrasse.
Viu-lhe as mãos sobre o carmesim de novo, de novo ela fez força e desta vez Mariko se pôs a prumo. Oscilou e quase caiu, depois seus pés se moveram e lentamente ela cambaleou através do carmesim e vacilou sem ajuda em direção à porta principal. Blackthorne resolveu que ela já fizera o bastante, suportara o bastante, provara o bastante, por isso avançou, segurou-a nos braços e ergueu-a bem no momento em que os sentidos a abandonaram.
Por um instante ergueu-se sozinho ali na arena, orgulhoso por estar sozinho e por ter ele decidido. Ela jazia como uma boneca quebrada nos seus braços. Então carregou-a para dentro e ninguém se moveu ou barrou-lhe a passagem.
CAPÍTULO 57
O ataque ao baluarte dos marrons começou no momento mais escuro da noite, duas ou três horas antes do amanhecer. A primeira onda de dez ninjas — os infames furtivos — veio dos telhados das muralhas em frente, agora não guardadas por cinzentos. Atiraram ganchos enrolados em pano e presos à ponta de cordas ao outro telhado e se penduraram sobre o abismo como muitas aranhas. Usavam roupas pretas bem justas, tabis pretos e máscaras pretas. Também estavam levemente armados com facas presas a correntes e shurikens — farpas e discos de arremesso, pequenos, em forma de estrela, aguçados como agulhas e com as pontas envenenadas, do tamanho da palma da mão. Às costas traziam mochilas a tiracolo e pequenos bastões finos.
Os ninjas eram mercenários. Eram artistas na ação furtiva, especialistas no infamante — espionagem, infiltração e morte repentina.
Os dez homens aterrissaram sem ruído. Enrolaram os arpéus, quatro os engancharam de novo numa saliência e imediatamente se lançaram para baixo, para uma varanda vinte pés abaixo. Assim que a atingiram, de modo igualmente silencioso, seus companheiros soltaram os arpéus, atiraram-nos para baixo, e se moveram por sobre as telhas para se infiltrar em outra área.
Uma telha estalou sob o pé de um homem e todos eles se imobilizaram. No adro, três andares e sessenta pés abaixo, Sumiyori interrompeu a ronda e olhou para cima. Seus olhos perscrutaram a escuridão. Esperou sem se mexer, a boca aberta um nada para aguçar a audição, os olhos procurando lentamente. O telhado dos ninfas estava envolto em escuridão, a lua tênue, as estrelas nubladas no ar úmido e denso. Os homens continuaram absolutamente imóveis, até a respiração controlada e imperceptível, aparentemente tão inanimados quanto as telhas sobre as quais se erguiam.
Sumiyori fez outro circuito com os olhos e os ouvidos, depois outro, e, ainda incerto, saiu do adro para ver com mais clareza. Agora os quatro ninfas na varanda também se encontravam no seu campo de visão, mas estavam tão imóveis quanto os outros e ele também não os notou.
— Ei — chamou ele os guardas da entrada, as portas fortemente trancadas agora —, estão vendo alguma coisa, ouvindo alguma coisa?
— Não, capitão — disseram as sentinelas alerta. — As telhas estão sempre estalando, mudando um pouco de posição. Deve ser a umidade ou o calor.
— Vá até lá em cima e dê uma olhada — disse Sumiyori a um deles. — Ou melhor, diga aos guardas do último andar que dêem uma busca, só como prevenção.
O soldado saiu às pressas. Sumiyori levantou os olhos novamente, depois meio que encolheu os ombros e, tranqüilizado, continuou a patrulha. Os outros samurais voltaram a seus postos, vigiando o lado exterior.
No alto do telhado e na varanda, os ninjas aguardavam nas suas posições congeladas. Nem seus olhos se moviam. Eram treinados para permanecerem imóveis durante horas, se necessário — o que representava apenas uma parte do seu treinamento perpétuo. Então o líder lhes fez um sinal e eles se moveram de novo ao ataque. Seus arpéus e cordas levaram-nos silenciosamente a outra varanda onde podiam se insinuar pelas estreitas janelas nas paredes de granito. Abaixo desse último andar, todas as outras janelas — posições de defesa para arqueiros — eram tão estreitas, que ninguém poderia entrar por fora. A outro sinal os dois grupos entraram simultaneamente.
Os dois aposentos se encontravam mergulhados em escuridão, com dez marrons dormindo em linhas nítidas. Foram mortos rapidamente e quase sem ruído, uma única estocada na garganta de quase todos, os treinados sentidos dos atacantes levando-os certeiramente aos alvos, e em poucos momentos o último dos marrons estava se debatendo desesperadamente, seu grito de advertência garroteado antes de começar. Depois, os quartos garantidos, as portas garantidas, o líder sacou uma pederneira e uma isca, acendeu uma vela, protegeu-a cuidadosamente com a mão e levou-a até a janela, de onde fez três sinais para a noite. Atrás dele seus homens estavam se certificando pela segunda vez de que todos os marrons estavam mortos. O líder repetiu os sinais, depois se afastou da janela e gesticulou, falando com eles numa linguagem de sinais, com os dedos.