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— .Então, talvez possam vir comigo, senhores — Struan enxugou o fio de sangue do queixo e atirou o açoite por sobre o balcão do bar, encaminhando-se para a porta.

— Você é um homem morto! — gritou Gorth, quando ele saía, novamente confiante. — Se apresse, seu filho da mãe! Struan só parou quando estava fora do clube, a salvo, na praia.

— Escolho maças como armas.

— Bom Deus, Tai-Pan... isso não é habitual — disse Horatio. — Ele é muito forte e você... bom, você... as últimas semanas lhe pesaram mais do que você percebe.

— Concordo plenamente — disse Masterson. — Uma bala entre os olhos é mais sensato. Ah, sim, Tai-Pan.

— Voltem e digam a ele agora. Não discutam. Minha mente é firme!

— Onde... onde você... bom, claro que isto deve ser mantido em segredo, não? Talvez os portugueses tentem impedi-lo.

— Sim. Contratem um junco. Vocês dois, eu, Gorth e seus padrinhos partiremos ao entardecer. Quero testemunhas e um duelo justo. Haverá espaço mais do que suficiente no convés de um junco.

Não vou matar você, Gorth, Struan exultou. Ah, não, isso seria fácil demais. Mas, pelo Senhor Deus, a partir de amanhã você nunca mais caminhará, nunca mais se alimentará com as próprias mãos, nunca mais verá, nunca mais voltará a fazer sexo. Eu mostrarei a você o que é a vingança.

***

Ao cair da noite, a notícia do duelo correra de boca em boca e, com a notícia, começaram as apostas. Muitas eram a favor de Gorth: ele estava em sua plena força e, afinal de contas, tinha boas razões para desafiar o Tai-Pan, se fosse verdade o boato de que Culum tinha sífilis e, sabendo disso, o Tai-Pan enviara Tess e Culum para o mar, com um capitão capacitado a casá-los, além do limite de três milhas.

Os que puseram dinheiro no Tai-Pan assim agiram porque esperavam, embora não acreditassem, que ele ganhasse. Todos sabiam de sua frenética ansiedade com relação à cinchona, e que sua legendária amante estava morrendo. E todos viam a perturbação que isso lhe causara. Só Lo Chum, Chen Sheng, Ah Sam e Yin-hsi tomaram emprestado cada tostão que puderam e apostaram no Tai-Pan, com confiança, pedindo aos deuses para velarem por ele. Sem o Tai-Pan. estariam perdidos, de qualquer jeito.Ninguém falou do duelo a May-may. Struan deixou-a, cedo, e voltou para sua residência. Queria dormir profundamente. O duelo não o perturbava; tinha certeza de que podia cuidar de Gorth. Mas, no processo, poderia ser mutilado, e sabia que precisaria ser muito forte e muito rápido.

Calmamente, caminhou pelas ruas tranqüilas, no calor de mais uma bela noite estrelada.

Lo Chum abriu a porta.

— Boa-noite, senhor. — Fez sinal, delicadamente, para a ante-sala. Liza Brock estava à espera.

— Boa-noite — disse Struan.

— Culum está com sífilis?

— Claro que não! Pelo sangue de Cristo, nós nem mesmo sabemos se eles estão casados. Talvez simplesmente tenham ido fazer uma viagem secreta.

— Mas ele esteve numa casa... quem sabe onde? Aquela noite em que foi assaltado.

— Culum não tem sífilis, Liza.

— Então, por que os outros disseram isso?

— Pergunte a Gorth.

— Eu perguntei e ele me disse que lhe contaram.

— Direi outra vez, Liza. Culum não tem sífilis.

Os grandes ombros de Liza estremeceram de soluços.

— Ah, Deus, o que fizemos?

Ela queria poder impedir o duelo. Gostava de Gorth, embora não fosse seu filho. Sabia que também teria culpa pelo sangue derramado — de Gorth, do Tai-Pan, de Culum ou do seu homem. Se não tivesse forçado Tyler a deixar Tess ir para o baile, então talvez tudo isso não tivesse acontecido.

— Não se preocupe, Liza — disse Struan, bondosamente. — Tess está bem, tenho certeza. Se casaram, você nada tem a temer.

— Quando o China Cloud voltará?

— Amanhã à noite.

— Deixará o nosso médico examiná-lo?

— Quem decide isso é Culum. Mas não proibirei. Ele não tem sífilis, Liza. Se tivesse, acha que eu permitiria o casamento?

— Sim, acho — disse Liza, atormentada. — Você é um demônio, e só o demônio sabe o que tem na cabeça, Dirk Struan. Mas eu juro por Deus, se você estiver mentindo eu o matarei, se meus homens não o matarem. Saiu às apalpadelas para a porta. Lo Chum abriu-a e fechou-a após sua saída.

— Senhor, é melhor ir dormir — disse Lo Chum alegremente. — Amanhã chega logo, hein?

— Vá para o inferno.

A aldrava de ferro da porta da frente causou um eco surdo, através da residênciaadormecida. Struan ficou atentamente à escuta, na ventilada calidez de seu quarto e, depois, ouviu os passos macios de Lo Chum. Saiu da cama, com a faca na mão, e agarrou seu robe de seda. Foi até o patamar, rápida e silenciosamente, e espiou por sobre a balaustrada. Dois andares abaixo, Lo Chum pôs a lanterna no chão e destrancou a porta. O relógio antigo bateu 1:15.

Padre Sebastião estava no umbral.

— O Tai-Pan pode ver-me?

Lo Chum fez um sinal afirmativo com a cabeça e pôs de lado a machadinha que segurava atrás das costas. Começou a subir a escada, mas parou quando Struan gritou.

— Sim?

O Padre Sebastião esticou o pescoço para o alto, em meio à escuridão, com os tendões do pescoço saltados, devido ao imprevisto do grito.

— Sr. Struan?

— Sim? — disse Struan, com a voz estrangulada.

— Sua Eminência me mandou aqui. Temos a casca de cinchona.

— Onde está?

O monge segurava uma pequena bolsa suja.

— Aqui. Sua Eminência disse que o senhor estava à espera de um mensageiro.

— E o preço?

— Nada sei a respeito disso, Sr. Struan — gritou com voz fraca Padre Sebastião. — Sua Eminência, simplesmente, disse-me para tratar qualquer pessoa à qual o senhor me conduzisse. Só isso.

— Estarei aí num segundo — berrou Struan, voltando às carreiras para o quarto. Enfiou as roupas às pressas, lutou com as botas, correu para a porta e parou. Depois de pensar um segundo, pegou o chicote de ferro e desceu as escadas, aos saltos. Padre Sebastião viu a maça e recuou.

— Bom-dia, Padre — disse Struan. Disfarçou a náusea provocada pelo hábito sujo do monge e detestou, de novo, todos os médicos.

— Lo Chum, quando o Sr. Sinclair chegar aqui, leve-o até lá, entendido?

— Entendido, senhor.

— Vamos, Padre Sebastião!— Só um momento, Sr. Struan! Antes de irmos, devo explicar uma coisa. Nunca usei cinchona antes... nenhum de nós usou.

— Bom, isso não importa, não é?

— Claro que importa! — exclamou o descarnado monge. — Tudo que sei é que devo fazer um “chá” com esta casca, fervendo-a. O problema é que não sei ao certo por quanto tempo fervê-la, ou se é preciso fazer um chá forte ou fraco. Ou a quantidade que o paciente deve tomar. Ou em quantas doses. O único tratado médico disponível que fala na cinchona é em latim arcaico... e muito vago!

— O bispo disse que ele teve a malária. Quanto chá tomou?

— Sua Eminência não se lembra. Só que tinha um gosto muito amargo e o enjoou. Acha que tomou chá durante quatro dias. Sua Eminência me disse para deixar bastante claro que estamos fazendo o tratamento sob sua responsabilidade.

— Sim. Entendo muito bem. Vamos!

Struan correu porta afora, com o Padre Sebastião a seu lado. Seguiram pela praia, procurando um caminho mais curto, e começaram a percorrer uma silenciosa avenida marginada de árvores.

— Por favor, Sr. Struan, não tão depressa — disse o Padre Sebastião sem fôlego.

— Está prevista mais febre para amanhã. Precisamos correr.

Struan cruzou a Praça de São Paulo e se encaminhou, impacientemente, para outra rua. De repente, seus instintos advertiram-no e ele parou, atirando-se para um lado. Uma bala de mosquete atingiu o muro, junto dele. Puxou para baixo o padre aterrorizado. Outro disparo. A bala cortou o ombro de Struan e ele amaldiçoou a si mesmo por não trazer pistolas.