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— Chutou os destroços, sem ligar para os cules que estavam a um lado, esperando pacientemente. — Por que diabo ele tinha de morrer numa ocasião dessas? Arengou por alguns minutos e depois sentou-se num banquinho.

— O que vai fazer? Recomponha-se. Pense!

Bom, disse a si mesmo, a primeira coisa é tirar o jornal. Edição especial. Como? Impresso manualmente.

— Sim, impresso manualmente — repetiu, em voz alta. — Você tem a mão-de-obra e pode fazer isso. E então?

Notou os cules a observá-lo. Então fique com a boca calada, advertiu a si mesmo. Tire o jornal e então vá procurar aquele jovem idiota desamparado, Culum, e faça-o empregar dinheiro numa nova impressora. Você pode dobrá-lo facilmente. Sim. E fique com a boca calada.

Chegou Blore. Seu rosto estava sem vida.

— Bom-dia — disse. — Que maldita confusão! As arquibancadas sumiram, e o padoque. Tudo. Perdemos quatro cavalos... o capão também, maldição!

— O Tai-Pan está morto.

— Ah, meu Deus! — Blore recostou-se contra a porta quebrada. — Isso acaba com tudo. Ah, bom, pensei mesmo que era bom demais para poder durar.

— Hein?

— Hong Kong... o Jóquei Clube... tudo. Isto é o fim. Pense bem. A Colônia é um desastre. Esse novo patife, o Whalen, vai dar uma olhada e morrer de rir. Não há esperança agora, sem o Tai-Pan. Diabo, eu gostava dele.— Foi ele quem mandou você me procurar, não? Para me entregar o despacho?

— Não — disse Blore. O Tai-Pan fizera-o jurar segredo. Um segredo era um segredo. — Pobre sujeito. De certa maneira, estou satisfeito por ele não ter vivido para ver o fim da Colônia.

Skinner tomou-o pelo braço e apontou para o porto.

— O que há ali?

— Hein? O porto, por Deus!

— Esse é que é o problema das pessoas. Não usam as cabeças e nem os olhos. A frota está salva... todos os navios mercantes! Perdemos uma fragata, que encalhou, mas será consertada e voltará para o mar dentro de uma semana. O mesmo aconteceu com o Resting Cloud. O Boston Princess afundou em Kowloon. Mas foi tudo. Não entende? O pior tufão da história submeteu Hong Kong ao teste... e ela passou com todas as bandeiras drapejando, por Deus! O tufão foi um grande pagode. Acha que o almirante não vai entender? Pensa que até aquele imbecil do Cunnington ignora que todo nosso poder está na frota... pense o que pensar aquele general debilóide? Poder marítimo, por Deus!

— Santo Cristo, pensa mesmo assim?

Skinner já voltara para dentro e estava tirando o lixo de seu caminho. Sentou-se, pegou uma pena, tinta e papel e começou a rabiscar.

— Se eu fosse você, começaria a fazer planos para as novas arquibancadas. Quer que eu publique que vai cumprir o programa estabelecido?

— Sim. Ótimo! Sim. — Blore pensou um momento. — Vamos começar um costume... teremos uma corrida especial. O maior prêmio do ano... a maior corrida da temporada. Vamos chamá-la o Grande Prêmio Tai-Pan.

— Ótimo. Esta noite, você lerá a respeito disso no jornal. Blore espiou Skinner escrevendo.

— Está fazendo o obituário dele?

Skinner abriu uma gaveta e empurrou um maço de papel em direção a ele.

— Já o escrevera há alguns dias. Leia. Depois você pode ajudar-me com a impressão manual.

***

Culum e Tess ainda estavam em pé onde Skinner os deixara.

— Vamos, amor — disse Tess, puxando-lhe o braço, angustiada.

Com um esforço Culum concentrou-se.— Por que você não vai para bordo do White Witch? Tenho... tenho certeza de que estão ansiosos para saber se você está salva. Irei para bordo mais tarde. Deixe-me só um pouquinho, está bem, querida? Preciso... bom, só quero ficar um pouco sozinho.

— Ah, Culum, o que vamos fazer?

— Não sei. Não sei.

Viu que ela erguia os olhos para ele e depois partia. Ele continuou caminhando em direção ao Cabo Glessing, sem ouvir e sem ver, o tempo parando, para ele. Ah, Deus do céu, o que farei?

— Sr. Struan?

Culum sentiu que alguém lhe puxava o braço e saiu de seu estupor. Notou que o sol estava alto no céu e ele estava encostado no pau da bandeira partida do Cabo Glessing. O mestre-d’armas olhava-o.

— Receba os cumprimentos de Sua Excelência, Sr. Struan. Quer fazer o favor de subir a bordo?

— Sim, sim, naturalmente — disse Culum, sentindo-se vazio e embrutecido.

Permitiu que o mestre-d’armas o guiasse até o escaler à espera. Subiu o passadiço da nau capitania e, depois, desceu.

— Meu querido Culum — disse Longstaff — que notícia terrível. Terrível. Quer Porto?

— Não. Não, obrigado, Excelência.

— Sente-se. Sim, terrível. Chocante. Logo que ouvi a notícia, mandei buscá-lo para lhe apresentar minhas condolências.

— Obrigado.

— Vou partir com a maré, amanhã. O novo plenipotenciário mandou notícia por Monsey de que está em Macau. — Maldito Whalen, por que diabo não esperou? Maldito tufão! Maldito Dirk! Maldito tudo! — Já conhece Monsey, não?

— Não... não senhor.

— Não importa. Puxa vida, que coisa triste. Monsey estava na residência e não sofreu um só arranhão. Sim, terrível. Tudo é uma questão de pagode. — Aspirou rapé e espirrou. — Ouviu dizer que Horatio foi morto também?

— Não... não, senhor. A última vez... pensei que ele estava em Macau.

Idiota, por que tinha de morrer? Complica tudo.

— Ah, a propósito, seu pai tinha uns documentos para mim. Eu precisava deles, antes de partir.

Culum revistou sua memória. O esforço esgotou-o ainda mais.— Ele não falou a respeito comigo, Excelência. Nada sei a respeito deles.

— Bom, tenho certeza de que os guardo em lugar seguro — disse Longstaff, encantado por ver que Culum não sabia de nada. — Um cofre, Culum, é lá onde devem estar. Onde fica seu cofre particular?

— Eu... eu não sei, senhor. Perguntarei a Vargas.

— Vamos, Culum, recomponha-se. A vida continua. Os mortos devem enterrar os seus mortos, e tudo mais. Não deve desistir, não é? Onde fica o cofre dele? Pense! Na residência? A bordo do Resting Cloud?

— Não sei.

— Então sugiro que verifique, e muito depressa. — A voz de Longstaff se tornou mais aguda. — É um assunto da máxima importância. E não fale com ninguém. Sabe qual o castigo por traição?

— Sim... sim, claro — respondeu Culum, assustado com Longstaff.

— Ótimo. E não esqueça que você ainda é vice-secretário colonial e se encontra sob solene juramento à Coroa. Coloquei os documentos nas mãos de seu pai para que os guardasse em segurança. Documentos diplomáticos altamente secretos referentes a uma “potência amiga”. Mapas, documentos em russo com traduções inglesas. Encontre tudo. Volte a bordo quando tiver o material. Volte a bordo ao entardecer, de qualquer maneira. Se não puder cumprir a tarefa, eu a farei por mim mesmo. Ah, sim, e vou confiar a você algumas sementes. Chegarão dentro de alguns dias. Você vai reencaminhá-las para mim e tratará o assunto com igual sigilo. Ordenança! — gritou. A porta se abriu imediatamente.

— Sim, senhor!

— Acompanhe o Sr. Culum à terra!

Culum voltou para a chalupa em pânico. Ele foi às pressas até o Resting Cloud. Estava no meio da cidade nas sampanas, quase na vertical. Soldados haviam sido colocados nas imediações, como proteção contra saqueadores. Escalou o barco e dirigiuse à cabina.

Lim Din montava guarda, com uma machadinha, em frente aos alojamentos de Struan.

— O Senhor está morto? — perguntou.

— Sim.

Lim Din ficou calado. E nem sua expressão mudou.

— Quando o Tai-Pan tinha papel... documento importante... onde guardava? — perguntou Culum.

— Hein?

— Documento... põe cofre. Tem cofre? Caixa segura?