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— Por quê?

— Todas as mortes lá em nosso país me fizeram pensar. Sarah tem razão. A vida é breve demais para ficarmos aqui suando e morrendo. Quero alguma paz. E existem mais coisas além do dinheiro. Você pode comprar a minha parte. Quero partir no próximo navio.

— Por quê?

— Estou cansado. Cansado!

— Você é apenas fraco, Robb. Sarah deu em cima de você outra vez, não foi?

— Sim, sou fraco e... sim, ela deu em cima de mim outra vez, mas já decidi. São mortes demais. Em excesso.

— Não posso comprar sua parte. Estamos em bancarrota. — Struan entregou-lhe a carta do banqueiro. Robb leu a carta. Seu rosto envelheceu ainda mais.

— Malditos!

— Sim. Mas isto não muda a situação... continuamos em bancarrota. — Struan enfiou outra vez as botas e se levantou.

— Sinto muito, Culum, a sociedade não tem valor. Houve uma corrida ao nosso banco. O ar na cabina pareceu ficar mais espesso.

— Temos cem mil na Escócia — disse Robb. — Eu fico com a metade e você pega

o resto.

— Obrigado, Robb. Falou como um homem. Robb esmurrou a escrivaninha.

— Não foi minha culpa se o banco fechou as portas!

— Sim. Então não peça metade do nosso dinheiro, quando precisamos de cada centavo.

Você precisará, não eu. Você vai encontrar uma solução, sempre encontra.

— Cinqüenta mil libras não bastarão a Sarah por cinco anos.

— Isso é problema meu! O dinheiro não está nos livros, de maneira que é legalmente nosso. Vou pegar metade. Minha parcela nos negócios vale vinte vezes isso!

— Estamos em bancarrota! Será que não consegue meter isso na cabeça? Bancarrota!

A porta da cabina se abriu e entrou na sala uma menininha de cabelos dourados. Tinha nas mãos uma boneca de palha. Tinha o rosto contraído.

— Olá, paizinho. Olá, tio Dirk. — Ergueu os olhos para Struan. — Eu sou feia? Com um esforço, Struan tirou os olhos de Robb.

— O quê? Karen, minha garotinha.

— Sou feia?

— Não. Não. Claro que não, Karen. — Struan levantou-a do chão. Quem andou dizendo essas coisas terríveis a você, garota?

— A gente estava brincando de escola no Resting Cloud. Foi Lilibet.

— Lilibet Brock?

— Ah, não. Ela é minha melhor amiga. Foi Lilibet Não-Sei-de-Quê.

— Bom, você não é feia. Diga a Lilibet Não-Sei-de-Quê que é falta de educação dizer uma coisa dessas. Você é muito bonita.

— Ah, bom! — Karen sorriu amplamente. — Meu papai sempre me diz que sou bonita, mas eu queria lhe perguntar, porque você sabe. Você sabe tudo. — Ela lhe deu um grande abraço.

— Obrigada, tio Dirk. Agora me ponha no chão. — Ela dançou até a porta. — Estou feliz de não ser feia. Robb se deixou cair em sua cadeira. Afinal, disse:

— Malditos banqueiros. Sinto muito. É minha culpa... e sinto muito. Eu disse... sinto muito.

— Eu também sinto muito, rapaz. Robb tentava inutilmente pensar.

— O que poderemos fazer?

— Não sei. Será que você não pode fazer isso, Robb? Dar-me alguns meses. Enviaremos Sarah e as crianças pelo primeiro navio. Quanto antes, melhor, assim escaparão à temporada dos tufões.

— Talvez eu possa arranjar um empréstimo em algum lugar. Precisamos pagar as letras à vista. Perderemos os navios... tudo.

— Robb forçou a mente a parar de pensar em Sarah. — Mas como, no curto espaço de tempo de que dispomos? — Torceu nervosamente os dedos. — A correspondência chegou ontem. Nada importante para nós. Nenhuma notícia do nosso país. Talvez outros saibam da corrida ao nosso banco. Compramos algumas ações de Brock, para mantê-lo sob vigilância. Talvez ele saiba da corrida ao nosso. Será por isso que ele quer encontrar você?

— Talvez. De qualquer maneira, ele vai colocar a corda em nosso pescoço, e bem colocada, se descobrir. Se é que não foi ele quem começou tudo. Ele comprará nossas letras e nos arruinará.

— Por quê? — perguntou Culum.

— Porque eu o arruinarei, se tiver a mínima chance. Culum teve vontade de perguntar por que, e dizer a eles que também ia voltar para casa no próximo navio. Mas seu pai parecia tão triste e Robb estava tão taciturno. Amanhã ele lhe diria.

— Preciso dormir durante algumas horas — disse Struan. — Vou desembarcar. Você e Sarah voltem para o Resting Cloud, hein? Perry recebeu ordens de ir embora ao entardecer. Eu o demiti.

— Quem vai substituí-lo?

— Não sei — disse Struan, enquanto saía. — Mande um recado para Brock. Irei vê-lo em terra, ao entardecer.

CAPÍTULO TRÊS

Struan dormira um pouco. A comida, na mesa, estava intacta. Ele olhou, através da porta da tenda, para os navios ancorados. O sol se punha e uma lua nublada estava próxima à linha do horizonte. Grandes massas de cúmulo dominavam o céu. O vento prometia tempestade.

Ti-sen, sua mente continuava a repetir. Ti-sen. Ele é o único que pode salvar você. Sim, mas isto é traição para com tudo em que você acredita, tudo aquilo para que trabalhou.

McKay chegou com uma lanterna acesa e depositou-a sobre a mesa. A tenda era espaçosa e confortável. Havia tapetes no chão pedregoso.

— A chalupa de Brock se aproxima da praia, senhorrr.

— Leve os homens e se mantenha afastado, McKay.

— Sim, senhorrr.

— Sabe se já encontraram o Ramsey?

— Não, senhorrr.

— Onde está ele?

— Não sei, senhorrr.

Struan fez um sinal com a cabeça, distraidamente.

— Amanhã colocarei em ação todos os meus espiões, para descobrir onde ele está.

— Peço perdão, senhorrr, já espalhei a notícia, senhorrr. — McKay tentou esconder sua ansiedade. — Se ele estiver a bordo, é por maldade de alguém. — Depois, acrescentou — eu me sinto mal por causa do Capitão Perry, senhorrr.

Os olhos de Struan endureceram-se de repente.

— Vou lhe dar quinze dias para provar que eu tinha razão quanto a Isaac. Quinze dias, senão você vai ser demitido com ele.

— Sim, senhorrr. — McKay sentiu um espinho lhe subir dos testículos às tripas, e maldisse a si próprio por abrir a boca. Você nunca vai aprender, seu louco idiota? Os passos de Brock eram pesados, na praia. Ele ficou em pé à entrada da tenda.

— Permissão para subir a bordo, Dirk?

— Sim, Tyler.

McKay saiu. Brock sentou-se à mesa e Struan serviu-lhe uma grande dose de conhaque.

— Foi horrível a perda de sua família. Sei como a gente se sente. Perdi duas mulheres de parto, as crianças também. Horrível.

— Sim.

— Não tem muito espaço para manobrar — disse Brock, examinando a tenda.

— Está com fome? — Struan indicou a comida.

— Muito obrigado. — Brock pegou um frango, partiu-o em dois e arrancou metade da carne branca. Usava no dedo mínimo um anel de ouro com uma grande esmeralda. Parece que o pagode da Casa Nobre acabou.

Pagode é uma palavra forte demais.

Brock riu.

— Vamos, Dirk. Uma companhia precisa ter barras de ouro para sustentar seu crédito. Até a Casa Nobre.

— Sim.

— Gastei muito tempo, Dirk, e muito dinheiro, investigando vocês. — Brock retirou a outra metade do peito do frango e devorou-o. — Você tem um bom cozinheiro. Diga-lhe que lhe darei emprego.

— Ele gosta do que tem.

— Sem dinheiro não há emprego, meu caro. E nada de banco, nada de crédito, nada de navio, nada de nada! — Brock partiu outro frango. — Está guardando o champanha? Deve ser para uma ocasião especial, aposto.