Bjurman urrou através da fita adesiva quando Lisbeth Salander afastou brutalmente suas nádegas e enfiou o tampão no lugar previsto.
— Pare de berrar — disse Lisbeth Salander imitando a voz dele. — Se não se comportar, serei obrigada a te punir.
Levantou-se e contornou a cama. Ele a acompanhou com o olhar... Merda, o que é isso? Lisbeth Salander havia trazido a tevê de tela grande da sala para o quarto. O aparelho de DVD estava no chão. Ela olhou para ele, sempre segurando o chicote na mão.
— Está prestando bastante atenção? — perguntou. — Não tente falar, basta balançar a cabeça. — Entende o que estou dizendo?
Ele assentiu com a cabeça.
— Certo. — Ela se inclinou para pegar sua mochila. — Reconhece isto? — Ele aquiesceu com a cabeça. — É a mochila que eu trazia quando vim te ver na semana passada. Peguei emprestada da Milton Security. — Ela abriu um zíper na parte inferior. — Aqui tem uma câmera digital. Você costuma assistir de vez em quando Insider na Tv3? Os repórteres sacanas utilizam uma mochila como esta para filmar cenas com uma câmera oculta.
Tornou a fechar a mochila.
— Deve estar se perguntando onde fica a objetiva. O detalhe está todo aí. Grande angular com fibra ótica. A lente parece um botão e está disfarçada na fivela da alça. Você deve estar lembrado que eu pus a mochila bem aqui, em cima desta mesa, antes que você começasse a me tocar. Tomei o cuidado de verificar se a objetiva estava dirigida para a cama.
Ela mostrou um DVD e a seguir o introduziu no aparelho. Depois virou a poltrona e se instalou de modo a poder ver a tela da tevê. Acendeu mais um cigarro e acionou o controle remoto. O advogado Bjurman viu-se abrindo a porta a Lisbeth Salander. Não sabe ler as horas?, ele perguntava, irritado.
Ela passou o DVD inteiro. O filme tinha noventa minutos de duração e terminou no meio de uma cena em que o dr. Bjurman, nu e encostado à cabeceira da cama, bebia um copo de vinho enquanto contemplava Lisbeth Salander estendida com as mãos atadas nas costas.
Ela desligou a tevê e continuou sentada na poltrona sem dizer nada por uns dez minutos e sem olhar para ele. Bjurman nem ousava se mexer. Ela se levantou, foi até o banheiro, depois voltou e sentou-se de novo na poltrona: Sua voz era como lixa.
— Cometi um erro na semana passada — disse. —Achei que mais uma vez seria obrigada a te chupar, o que é absolutamente nojento, mas não ultrapassa demais minhas capacidades. Achei que fosse obter, de modo muito tranquilo, provas inquestionáveis, evidentes, de como você é um canalha perverso e imundo. Eu o subestimei. Não percebi o quanto você é um sujeito podre e doente. Vou ser bem clara — ela continuou. — Esse filme mostra você estuprando uma jovem de vinte e quatro anos, retardada mental, da qual você é o tutor responsável. Com certeza você nem imagina o quanto posso ser retardada mental quando é necessário. Qualquer um que vir esse DVD vai entender que você não só é um lixo mas também um sádico louco furioso. Um filme bem instrutivo, não acha? Eu diria que você, e não eu, é que seria internado. Concorda comigo?
Esperou. Ele não reagiu, mas ela viu que ele tremia. Pegou o chicote e desferiu um golpe seco nos órgãos sexuais dele.
— Concorda comigo? — repetiu com voz mais forte. Ele assentiu com a cabeça.
— Ótimo. Assim estamos nos entendendo.
Ela puxou a poltrona e sentou-se de modo a poder olhá-lo bem nos olhos.
— Bem, o que você e eu poderíamos fazer para remediar essa situação? — Ele não podia responder. — Não tem algumas idéias? — Como ele não reagisse, ela esticou a mão, pegou seus testículos e puxou até o rosto de Bjurman se contorcer de dor. — Tem ou não tem algumas boas idéias? — repetiu.
Ele balançou negativamente a cabeça.
— Melhor assim. Porque, se por acaso vier a ter alguma idéia no futuro, eu ficarei muito zangada com você.
Jogou o corpo para trás e acendeu outro cigarro.
— Então eu vou te contar, eu, o que vai acontecer. Na semana que vem, assim que você conseguir expulsar esse brinquedinho de borracha do seu cu, você vai dar instruções ao meu banco de que somente eu — e mais ninguém
— terá acesso à minha conta daqui pra frente. Entende o que estou dizendo?
O advogado Bjurman concordou com a cabeça.
— Perfeito. Você não entrará mais em contato comigo. No futuro só nos veremos se eu tiver vontade. Que fique bem claro que você está proibido de me visitar.
Ele concordou com a cabeça várias vezes e deu um suspiro. Ela não tem a intenção de me matar.
— Se tentar entrar em contato comigo, cópias desse DVD vão chegar a todas as redações dos jornais de Estocolmo. Está entendendo?
Ele assentiu com a cabeça várias vezes. Preciso pôr as mãos nesse filme.
— Uma vez por ano, enviará o relatório sobre o meu estado à comissão de tutelas. Escreverá que levo uma existência perfeitamente normal, que tenho um trabalho fixo, que ajo de maneira conveniente e que você não vê nada de anormal no meu comportamento. Certo?
Ele fez que sim com a cabeça.
— Todo mês você escreverá um relatório fictício sobre os nossos encontros. Contará em detalhe o quanto sou confiável e o quanto estou progredindo. Enviará uma cópia para mim, certo?
Ele balançou de novo a cabeça. De passagem, Lisbeth Salander notou gotas de suor surgindo em sua testa.
— Dentro de um ano ou dois, iniciará conversações com o juiz para obter a revogação da minha tutela, usando para isso os relatórios fictícios dos nossos encontros mensais. Encontrará um psicólogo que prestará juramento de que sou absolutamente normal. Você se esforçará nesse sentido. Fará exatamente tudo que estiver ao seu alcance para que eu seja declarada emancipada.
Ele assentiu com a cabeça.
— E sabe por que fará o melhor possível? Porque tem uma razão fodida para você agir assim. Se não fizer o melhor possível, mostro esse filminho pra todo mundo.
Ele escutava cada sílaba pronunciada por Lisbeth Salander. Um brilho súbito de ódio passou por seus olhos. Disse a si mesmo que ela cometia um erro em deixá-lo viver. Vai pagar caro, sua puta suja. Cedo ou tarde, vou te esmagar. Mas continuou balançando a cabeça com entusiasmo a cada pergunta.
— O mesmo vale se tentar entrar em contato comigo. — E passou a mão pelo pescoço num gesto de degola. — Adeus, belo apartamento; adeus, trabalho; adeus, seus milhões em contas do exterior.
Os olhos de Bjurman se arregalaram ao ouvi-la mencionar o dinheiro. Merda, como ela sabe disso?...
Ela sorriu, deu uma tragada no cigarro, depois o jogou no carpete e o esmagou com o calcanhar.
— Você me dará cópias das suas chaves daqui e do escritório. Bjurman franziu as sobrancelhas. Ela se inclinou com um sorriso hipócrita.
— Daqui em diante eu controlarei a sua vida. Quando menos esperar, talvez quando estiver dormindo, vou entrar de repente aqui no seu quarto com isto nas mãos. — Mostrou o bastão elétrico. — Vou vigiar você. — Se alguma vez eu te encontrar com uma mulher — e pouco importa que ela esteja aqui de livre e espontânea vontade ou não —, se alguma vez eu te encontrar com uma mulher, qualquer que seja...
E Lisbeth passou novamente os dedos pelo pescoço.
— Se eu morrer... se eu sofrer um acidente, for atropelada, seja lá o que for... cópias desse filme serão enviadas aos jornais. Junto com uma história detalhada onde eu conto como é ter você como tutor. Outra coisa. — E ela se inclinou para a frente, para que seu rosto ficasse a poucos centímetros do dele. — Se me tocar outra vez, eu te mato. Pode ter certeza.
O dr. Bjurman acreditou nessas palavras. Não havia lugar para blefe nos olhos dela.
— Lembre-se de que eu sou maluca.