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Tomou o último gole do uísque. Sem os sócios estamos bloqueados, mesmo depois de todos esses anos — são eles que sabem com quem falar, a quem subornar, com quanto dinheiro ou que porcentagem, quem adular, a quem recompensar. Eles são os porta-vozes, são eles que têm os contatos. Mesmo assim, o Chinês estava certo: seja quem for o vencedor, Khomeini, Bakhtiar, ou os generais, eles precisam dos helicópteros..

Na cozinha, Genny estava quase chorando. A lata secreta de haggis, que escondera com tanto cuidado por quase um ano e que acabara de abrir, estava estragada. E Duncan gosta tanto disso. Como é que ele podia gostar disso, uma mistura de coração, fígado e pulmão de carneiro, mais trigo, cebola, sebo, temperos e molho, tudo enfiado num saco, feito com o estômago do pobre carneiro, e depois fervido por várias horas.

— Ugh! Dane-se tudo!

Ela fizera o jovem Scot Gavallan trazer a lata em segredo, na sua rápida licença, para esta ocasião especial.

Hoje era aniversário de casamento deles e esta seria a sua surpresa para Duncan. Que droga!

Não é culpa de Scot que a maldita lata tenha estragado, pensou, infeliz. Mesmo assim, merda, merda, merda! Planejei este maldito jantar durante meses e agora ele está arruinado. Primeiro o maldito açougueiro me deixa na mão, mesmo eu tendo pago em dobro e adiantado, maldito seja o seu "Insha'Allah" e depois, porque os bancos estão fechados, não tive dinheiro para subornar o rival dele para me vender uma perna fresca de carneiro e não uma carne de carneiro velho, depois a mercearia decide entrar em greve, depois...

A janela da pequena cozinha estava meio aberta e ela ouviu outra rajada de metralhadora. Mais perto desta vez. Em seguida, trazido pelo vento, veio o som distante e rouco da multidão: "Allahhh-u Akbarrr... Allahhh-u Ak-barrr..." repetido sem cessar. Estremeceu, achando-o estranhamente ameaçador. Antes dos problemas começarem, ela achava tranqüilizante o chamado dos muezins para as orações, cinco vezes por dia, do alto dos minaretes. Mas não agora, não vindo da garganta da multidão.

Agora odeio este lugar, pensou. Odeio as armas e odeio as ameaças. Havia outra, na caixa do correio, a segunda — como a primeira, mal datilografada e copiada no papel mais ordinário: "Em 1º de dezembro, nós demos um mês para você e sua família deixarem o país. Vocês ainda estão aqui. Vocês agora são nossos inimigos e vamos lutar contra vocês até o fim." Não havia nenhuma assinatura. Quase todo estrangeiro no Irã havia recebido uma mensagem dessas.

Odeio as armas, odeio o frio, a falta de aquecimento e de luz, odeio os seus banheiros infectos e o fato deles se agacharem como animais, odeio toda a estúpida violência e a destruição de algo que era realmente muito bonito. Odeio ficar em filas. Danem-se todas as filas! Dane-se o patife que estragou a lata de haggis, dane-se esta cozinha infecta e esta torta de carne em conserva! Não consigo entender como os homens podem gostar disso! Ridículo! Carne em conserva misturada com batatas cozidas, um pouco de cebola, manteiga e leite se você tiver, migalhas de pão por cima, e deixar no forno até corar. Ugh! E quanto à couve-flor, o cheiro dela cozinhando me dá vontade de vomitar, mas eu li que é bom para diverticulite e qualquer um pode ver que Duncan não está tão bem quanto deveria. Ele é um tolo em pensar que pode me enganar. Será que ele enganou Charlie? Duvido. Quanto a Claire, que idiota ela foi em deixar um homem tão bom! Imagino se Charlie algum dia descobriu o caso que ela teve com aquele piloto da Guerney. Acho que não há mal nenhum, desde que você não seja apanhada — é difícil ficar tanto tempo sozinha — e se é isso que você quer. Mas estou contente deles terem se separado como amigos, embora ache que ela era uma cadela egoísta.

Ela se viu no espelho. Automaticamente, arrumou o cabelo e olhou para o seu reflexo. Para onde foi minha juventude? Não sei, mas foi-se. Pelo menos a minha, a de Duncan não, ele ainda é jovem, jovem para a idade — se ao menos ele se cuidasse. Maldito Gavallan! Não, Andy é legal. Fico contente que ele tenha se casado com uma moça tão simpática. Maureen vai mantê-lo na linha, a pequena Electra também. Tivera tanto medo que ele se casasse com aquela secretária chinesa. Ugh! Andy é legal, e o Irã também era. Era. Agora está na hora de partir e aproveitar nosso dinheiro. Sem dúvida. Mas como?

Riu alto. Acho que tanto faz.

Cuidadosamente, abriu o forno, piscou por causa do calor e do cheiro e tornou a fechá-lo. Não suporto torta de carne, disse a si mesma com irritação.

O jantar estava muito bom, a torta de carne dourada em cima, exatamente como eles gostavam.

— Quer abrir o vinho, Duncan? É persa, sinto muito, mas é a última garrafa. — Normalmente, eles mantinham um bom estoque de vinhos persas e franceses, mas as multidões haviam destruído e queimado todas as lojas de bebidas de Teerã, incentivadas pelos mulás, seguindo o fundamentalismo estrito de Khomeini. Beber qualquer tipo de bebida alcoólica era proibido pelo Corão. — O homem no bazar me disse que, oficialmente, não há nenhuma bebida para vender e que agora, mesmo nos hotéis ocidentais, é proibido vender bebidas.

— Isto não vai durar, as pessoas não vão aturar isso, nem o fundamentalismo, por muito tempo — disse Pettikin. — Não é possível, não na Pérsia. Historicamente, os xás foram sempre tolerantes, e por que não? Por quase três mil anos a Pérsia foi famosa pela beleza de suas mulheres, veja Azadeh e Xarazade, e pelos seus vinhedos e vinhos. O Rubãiyãt de Ornar Khayyãm não é um hino às mulheres, ao vinho e à canção? Pérsia eterna, eu diria.

— Pérsia soa tão melhor que Irã, Charlie, tão mais exótico, como costumava ser quando viemos para cá, tão mais agradável — disse Genny. Por um momento foi distraída por mais tiros, depois continuou, falando para disfarçar o nervosismo. — Xarazade me disse que o povo sempre chamou o país de Irã, ou Ayran. Parece que Pérsia era como os antigos gregos o chamavam, Alexandre, o Grande e os outros. A maioria dos persas ficou feliz quando o Reza Xá decretou que a Pérsia, daí em diante, seria Irã. Obrigada, Duncan — aceitou o copo de vinho, admirando sua cor, e sorriu para ele.

— Está tudo uma delícia, Gen — disse ele, e abraçou-a de leve.

O vinho fora saboreado. E a torta também. Mas eles não estavam alegres. Havia muito o que pensar. Mais tanques estavam se movimentando. Mais tiros. O clarão vermelho, sobre Jaleh, se espalhando. A ladainha das multidões ao longe. Então, no meio da sobremesa — bolo de frutas, outra das preferidas de McIver — um dos pilotos, Nogger Lane, chegou cambaleando, com as roupas rasgadas, o rosto muito machucado, amparando uma moça. Era alta e tinha cabelos e olhos escuros, estava descomposta e em estado de choque, balbuciando pateticamente em italiano, uma das mangas do casaco quase arrancada, com as roupas, o rosto, as mãos e os cabelos imundos, como se tivesse caído no esgoto.

— Fomos apanhados entre... entre a polícia e um maldito grupo de manifestantes — ele disse depressa, incoerentemente. — Algum desgraçado tirou a gasolina do meu tanque, então... mas os manifestantes, havia milhares deles, Mac. A rua parecia calma mas, de repente, todo mundo começou a correr e eles... os manifestantes, eles saíram de uma rua lateral e muitos tinham armas... Era aquela maldita ladainha sem parar, Allah-u Akbar, Allah-u Akbar, que fazia meu sangue gelar... Eu nunca... depois pedras, bombas, gás lacrimogêneo, tudo... aí a polícia e as tropas chegaram. E tanques, eu vi três, e pensei que os filhos da mãe iam se dispersar. Aí alguém começou a atirar do meio da multidão, e então havia armas por toda parte e... e corpos espalhados pela rua toda. Corremos para nos salvar e aí um grupo daqueles filhos da mãe nos viu e começou a berrar "demônio americano" e partiram atrás de nós e nos encurralaram num beco. Tentei dizer a eles que era inglês e que Paula era italiana, e não... mas eles estavam me cercando e... e se não fosse por um mulá um filho da mãe grande com uma barba preta e um turbante preto, esse... esse canalha mandou-os parar e Cristo, eles nos deixaram ir. Ele nos xingou e nos disse para dar o fora...