— Boa, cara — disse Scragger, aprovadoramente. — Agora abra os olhos.
Vossi tinha esperado óculos comuns de treinamento que excluíam a visibilidade exterior mas permitiam ver os instrumentos. Mas encontrou-se numa escuridão total. Entrando em pânico, sua concentração desapareceu e com ela a coordenação. Por um segundo, ficou inteiramente desorientado, o estômago embrulhado, imaginando que o aparelho fosse ficar desgovernado. Mas não ficou. Os controles permaneceram firmes nas mãos de Scragger.
— Jesusss — exclamou Vossi, sem fôlego, lutando contra o enjôo, levantando as mãos automaticamente para arrancar os óculos.
— Não tire os óculos! Ed, isto é uma emergência, você é o piloto, o único piloto a bordo e está em dificuldades... você não consegue enxergar. O que vai fazer? Pegue os controles! Vamos! Emergência!
Havia bile na boca de Vossi e ele cuspiu, com as mãos e os pés tremendo. Pegou os controles, corrigiu demais e quase gritou de medo quando deram uma guinada, pois estava esperando que Scragger ainda estivesse controlando-os. Mas não estava. Novamente Vossi corrigiu demais, totalmente desorientado. Desta vez Scragger corrigiu o erro.
— Acalme-se, Ed — ordenou. — Escute o maldito motor! Mantenha as mãos e os pés sincronizados. — Depois, com mais gentileza: — Firme agora, está indo bem, fique firme. Você vomita depois. Você está numa emergência, tem que pousar o aparelho, e há treze passageiros aos seus cuidados. Estou aqui a seu lado mas não sou um piloto. Agora, o que vai fazer?
As mãos e os pés de Vossi estavam novamente sincronizados e ele prestava atenção ao barulho do motor.
— Eu não posso ver, mas você pode?
— Claro.
— Então você pode me orientar!
— Claro! — A voz de Scragger ficou mais urgente. — É lógico que você precisa fazer as perguntas certas. Controle de Kish, HST saindo de trezentos em direção a Siri Três.
— Roger, HST.
— De agora em diante, meu nome é Bart — disse Scragger com uma voz diferente. — Sou um operário de um dos poços. Não entendo nada de vôo, mas posso ler um mostrador, se você me disser onde olhar.
Alegremente, Vossi entrou na brincadeira e fez as perguntas certas, com 'Burt' forçando-o a ir até os limites do seu conhecimento de controle de vôo, dos painéis, de onde estavam os mostradores, obrigando-os a só perguntar aquilo que um amador pudesse entender e responder. De vez em quando, se as perguntas não eram suficientemente precisas, Burt ficava histérico e dizia: Jesus, não consigo encontrar o mostrador, qual é o mostrador, pelo amor de Deus, são todos iguais! Explique de novo, mais devagar, oh, Deus, vamos todos morrer...
Para Vossi, só havia escuridão. O tempo não passava, não havia nem mostradores nem ponteiros que o tranqüilizassem, nada a não ser a voz que o forçava até o limite de sua resistência.
A 15 metros da chegada, com Burt avisando que estavam para pousar, Vossi sentiu-se nauseado, apavorado pela escuridão, sabendo que a pequena pista de pouso estava vindo ao seu encontro. Ainda dá tempo de interromper o pouso, de acelerar e me mandar daqui, mas quanto tempo?
— Agora você está a três metros de altura e a dez metros de distância, como queria.
Imediatamente, Vossi fez o helicóptero flutuar, coberto de suor.
— Perfeito, bem em cima do alvo, como queria.
A escuridão nunca fora tão intensa. Nem o seu medo. Vossi murmurou uma prece. Suavemente, foi diminuindo a potência. Pareceu levar uma vida inteira, e então os esquis tocaram o solo e eles estavam no chão. Por um momento, não acreditou. Seu alívio foi tão intenso que quase chorou de alegria. Depois, de muito longe, ouviu a voz de Scragger e sentiu-o tomar os controles.
— Deixe comigo, cara! Foi uma beleza, Ed. Nota dez. Pode deixar comigo, agora.
Ed Vossi tirou os óculos. Estava ensopado, com o rosto lívido, e escorregou no assento, mal enxergando o que se passava na plataforma diante dele, a pesada rede de corda esticada sobre o campo de pouso que mal tinha trinta metros de diâmetro. Jesus, estou no chão, estamos no chão, em segurança.
Scragger tinha posto o motor em ponto morto; não havia necessidade de desligar já que era uma parada curta. Ele cantarolava 'Waltzing Matilda', o que só fazia quando muito satisfeito. O rapaz saiu-se muito bem, pensou, mas quanto tempo ele vai levar para se recuperar? É sempre bom saber, e ficar alerta — quando se voa com alguém.
Ele se virou e fez um sinal com o polegar para cima para o homem que estava sentando no assento da frente, um dos engenheiros franceses que tinham vindo verificar o equipamento elétrico recentemente instalado neste poço. Os outros passageiros esperavam com paciência. Quatro eram japoneses, convidados dos funcionários e engenheiros franceses da EPF. Scragger tinha ficado inquieto por levar japoneses — trazia-lhe lembranças dos seus dias de guerra, recordações das perdas australianas no Pacífico e dos milhares que morreram nos campos de concentração japoneses e na ferrovia de Burma. Verdadeiros assassinatos, disse a si mesmo sombriamente, depois desviou a atenção para o desembarque.
O engenheiro abrira a porta e agora ajudava os trabalhadores iranianos a retirar a carga. Estava quente e úmido, e enervante, o ar tresandava a fumaça de petróleo. A cabine, como sempre, escaldante, com muita umidade, mas Scragger sentia-se bem. Os motores roncavam normalmente. Ele olhou para Vossi, ainda recostado no assento, com as mãos atrás da cabeça, tentando recuperar-se.
Ele é um bom rapaz, pensou Scragger, em seguida a voz que dominava a cabine atrás dele atraiu-lhe a atenção. Era George de Plessey, chefe dos funcionários franceses e gerente da EPF. Estava sentado no braço de um dos assentos, fazendo mais um dos seus intermináveis discursos, desta vez para os japoneses. Melhor do que eu, pensou Scragger, achando graça. Conhecia Plessey há três anos e gostava dele — por causa da comida francesa que fornecia e pela qualidade do seu bridge, do que ambos gostavam, mas não por sua conversa. Esse pessoal do petróleo é todo igual, só sabem falar de petróleo, e só querem falar disso, e para eles o resto da humanidade só está na terra para consumi-lo, pagar o diabo por ele até a morte — e até os crematórios são quase todos alimentados a óleo. Maldição! O petróleo subiu para US$14,80 o barril, há dois anos custava US$4,80 e alguns anos antes, US$1,80. Malditos saltea-dores, todos eles, a OPEP, as Sete Irmãs, e até o petróleo do mar do Norte.
— Todos estes poços são sustentados por pilares colocados no fundo do mar — dizia de Plessey — todos foram construídos e são operados por franceses...
Usava uma roupa cáqui e tinha cabelos louros e ralos e o rosto queimado de sol. Os outros franceses estavam conversando e discutindo. Isso é tudo o que eles sabem fazer, pensou Scragger, além de comer, beber e dar em cima de tudo quanto é mulher. Como aquele chato do Jean-Luc, o conquistador-mor de todos. Pelo menos, eles são todos diferentes — não como aqueles outros chatos. Os japoneses eram todos baixos, flexíveis e bem-arrumados, todos se vestiam do mesmo jeito: camisa branca de manga curta, gravata escura, calca escura e sapato escuro, os mesmos relógios digitais, óculos escuros; a única diferença estava nas idades. Como as sardinhas de uma lata, pensou Scragger.
— ...A água aqui, como em todo o golfo, é muito rasa, Monsieur Kasigi — dizia de Plessey. — Aqui só chega a trinta metros, e é fácil achar petróleo a cerca de trezentos metros. Temos seis poços nesta parte do campo que chamamos de Siri Três, estão todos em funcionamento, são ligados por oleodutos aos nossos tanques de estocagem na ilha Siri. A capacidade dos tanques é de três milhões de barris e todos os tanques estão cheios.