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— E o cais de Siri, Monsieur de Plessey? — Kasigi, o grisalho porta-voz dos japoneses, perguntou, num inglês claro e cuidadoso. — Não consegui vê-lo quando sobrevoamos a ilha.

— Estamos carregando em alto-mar no momento. Planejamos construir um embarcadouro no próximo ano. Enquanto isso, não será problema carregar seus petroleiros, Monsieur Kasigi. Garantimos um serviço rápido, um carregamento rápido. Afinal de contas, somos franceses. Amanhã o senhor verá. O seu Rikomaru se atrasou?

— Não. Estará aqui ao meio-dia. Qual a capacidade deste campo?

— Ilimitada — disse o francês, rindo. — No momento, só estamos retirando 75 mil barris por dia, mas, bon Dieu, no fundo do mar há um lago de petróleo.

— Capitão Excelência! — Na janela ao lado de Scragger apareceu o rosto sorridente do jovem Abdullah Turik, da equipe de bombeiros. — Eu bem, muito bem, o senhor?

— Muito bem, rapaz. E como estão as coisas?

— Estou feliz em vê-lo, capitão Excelência.

Há cerca de um ano, a base de Scragger, em Lengeh, fora alertada de que havia uma emergência neste poço. No meio de uma noite horrível o administrador iraniano comunicara que o bombeiro talvez estivesse com apendicite aguda e perguntava se eles podiam chegar lá o mais rápido possível, assim que amanhecesse — porque os vôos noturnos eram proibidos no Irã, exceto para emergências. Scragger estava de serviço e partira imediatamente — fazia parte da política da companhia ir imediatamente, mesmo com condições precárias de vôo, isto fazia parte do seu serviço especial. Ele tinha apanhado o rapaz, levara-o para o Hospital Naval Iraniano, em Bandar Abbas, e convencera o hospital a aceitá-lo. Se não fosse por isso, o rapaz teria morrido.

Desde então, o rapaz estava sempre ali para cumprimentá-lo, e uma vez por mês, havia sempre uma perna de carneiro na base, por mais que Scragger tentasse impedi-lo por causa da despesa. Uma vez, ele visitou a aldeia, no interior de Lengeh, onde o rapaz nascera. Era como as outras: sem instalações sanitárias, sem eletricidade, sem água, chão de terra, paredes de barro. O Irã era muito primitivo fora das cidades, mas, mesmo assim, ainda melhor do que o interior na maioria dos Estados do golfo. A família de Abdullah era como todas as outras, nem melhor nem pior. Muitos filhos, nuvens de moscas, algumas cabras e galinhas, uns poucos hectares de terra, mas breve, dissera o pai dele, breve vamos ter a nossa própria escola, piloto Excelência, e nosso próprio fornecimento de água e, um dia, eletricidade e, sim, é verdade, estamos muito melhor trabalhando no nosso petróleo que os estrangeiros extraem... graças a Deus por Ele nos ter dado o petróleo. Graças a Deus por ter permitido que meu filho Abdullah vivesse, foi a Vontade de Deus que persuadiu Vossa Excelência a ter tanto trabalho. Deus seja louvado!

— Como vão as coisas, Abdullah? — repetiu Scragger, apreciando o rapaz, que era moderno, diferente do pai.

— Bem. — Abdullah chegou mais perto, colocando o rosto quase do lado de dentro da cabine. — Capitão, disse hesitante, já não sorrindo mais, com a voz tão baixa que Scragger teve de se inclinar para a frente para ouvir. — Vai haver muita confusão, logo... Comunistas de Tudeh, mujhadins, talvez fedayins. Armas e explosivos, talvez um navio em Siri. Perigo. Por favor, não diga quem avisou, sim? — Depois tornou a colocar o sorriso no rosto e falou em voz alta: — Feliz aterrissagem, e torne a voltar logo, aga. — Acenou uma vez e, escondendo o nervosismo, foi se juntar aos outros.

— Claro, claro, Abdullah. — murmurou Scragger. Havia um certo número de iranianos observando, mas isso era comum. Os pilotos eram apreciados por serem o único elo de ligação em uma emergência. Viu o chefe de pouso dar o sinal com os polegares. Automaticamente, virou-se e checou se tudo estava trancado e se todos estavam de volta a seus lugares.

— Posso pilotar, Ed?

— Claro, Scrag.

A trezentos metros de altura, Scrag nivelou o aparelho, rumando para Siri Um, onde os outros passageiros deveriam desembarcar. Estava muito perturbado. Atirem pedras nos corvos, pensou. Uma bomba poderia fazer Siri Um explodir dentro do golfo. Era a primeira vez que havia qualquer rumor de problemas. O campo de Siri nunca fora afetado por nenhuma das greves que tinham fechado todos os outros campos, principalmente, conforme acreditavam os estrangeiros, porque a França dera asilo a Khomeini.

Sabotagem? O japonês não disse que amanhã chegaria um petroleiro? Sim, disse. O que fazer? Nada, no momento, apenas deixar Abdullah de lado por algum tempo — agora não é hora, não quando se está pilotando.

Olhou para Vossi. Ed saiu-se bem, muito bem, melhor do que... melhor do que quem? Sua mente percorreu todos os pilotos que treinara nesses anos. Centenas. Voava desde os 15 anos; em 1933, na Real Força Aérea Australiana, com 17 anos, Spitfires em 1939, como tenente da Aeronáutica, depois, em 1945, nos helicópteros e, em 1949, Coréia, saindo depois de vinte anos de serviço, ainda como tenente, ainda brigão, e com apenas 37 anos. Ele riu. Na Força Aérea estava sempre sendo repreendido.

— Pelo amor de Deus, Scragger, porque logo com o vice-almirante? Desta vez você se excedeu...

— Mas Wingco, foi o inglês quem começou, o filho da mãe disse que todos nós, australianos, éramos ladrões, tínhamos marcas de correntes em volta dos pulsos, e descendíamos de condenados!

— Ele disse? Esses malditos ingleses são todos iguais, Scrag, embora ele provavelmente tenha razão no seu caso, já que sua família sempre esteve na Austrália, mas mesmo assim você vai perder outra vez a promoção e se não se comportar vou impedir você de voar para sempre.

Mas nunca o fizeram. Como poderiam? Várias condecorações, 16 mortes, e três vezes mais missões, alegremente aceitas, do que qualquer outro em toda a RAAF. E ainda estava voando, que era tudo o que ele queria no mundo, ainda estava tentando ser o melhor e o mais prudente, e ainda querendo sair de uma situação de perigo com todos os passageiros a salvo. Se você pilota helicópteros, não pode ter falhas técnicas, pensou, sabendo que tivera sempre muita sorte. Não como alguns, tão bons pilotos quanto ele, que tinham dado azar. Você tem de ter sorte para ser um bom piloto.

Tornou a olhar para Vossi, contente de que não houvesse uma guerra, que era o maior campo de provas para um piloto. Não gostaria de perder o jovem Ed, ele é um dos melhores da S-G. Agora, qual foi o melhor dentre os que voaram com você? Charlie Pettikin, é claro, mas esse tinha mesmo de ser, fora piloto de táxi aéreo e passara por muitos apertos. Tom Lochart a mesma coisa. O sujo do Duncan McIver ainda é o melhor de todos, mesmo estando no chão, ele que vá para o inferno com o seu maldito exame médico trimestral — mas eu seria tão duro e tão cuidadoso com ele, se eu é que estivesse no chão e ele estivesse voando por aí aos 63 anos como se fosse um filhote de passarinho. Coitado.

Scragger deu de ombros. Se o DAC adotar os novos regulamentos a respeito de idade e aposentadoria obrigatória, estou frito. No dia em que não puder mais voar, vou para o céu, não há nenhuma dúvida quanto a isso.

Ainda faltava bastante para chegar a Siri Um. Pousava lá três vezes por semana, há mais de um ano. Mesmo assim, programava cada descida como se fosse a primeira vez. A segurança não é um acaso, precisa ser planejada, pensou.

— Hoje faremos um pouso bem suave em...

— Scrag.

— Sim, meu filho?

— Você me deu um susto dos diabos.

— Você deu um susto dos diabos em si mesmo, esta é a lição número um — disse rindo. — O que mais você aprendeu?

— Acho que aprendi como é fácil entrar em pânico, como você se sente solitário, impotente, e aprendi a abençoar os meus olhos. — Vossi disse quase gritando: — Acho que aprendi o quanto sou mortal, porra. Cristo, Scrag, eu fiquei com medo... me cagando de medo.