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Uma arma disparou ah perto, uma barricada feita de pneus pegou fogo e as chamas se elevaram no ar enquanto pequenos grupos de estudantes atiravam-se aos gritos, sobre as fileiras de Faixas Verdes. Ouviram-se mais tiros e agora a rua inteira explodiu em gritos e confusão, com os mais fracos sendo pisoteados. Um grupo de estudantes frenéticos arrastou-o em direção ao centro do combate.

A oitenta metros de distância, Xarazade estava gritando, lutando pela vida, tentando afastar-se para um dos lados para conseguir uma certa segurança O seu chador foi arrancado, seu lenço desapareceu. Ela estava machucada, com dor no estômago. Havia uma multidão em volta dela agora, atacando os que estavam contra eles, cada um por si, mas envolvidos pela selvageria da mui tidão. A batalha continuou, sem que ninguém soubesse quem era amigo ou inimigo, exceto os mulás e os Faixas Verdes que gritavam, tentando controlar o tumulto. Com um urro ensurdecedor, a multidão islâmica hesitou por um momento e depois avançou. Os fracos caíram e foram esmagados. Homens, mulheres. Gritos, berros, pandemônio, todos invocando a sua própria versão de Deus.

Os estudantes resistiram desesperadamente, mas foram esmagados. Sem piedade. Muitos caíram. Foram pisoteados. Então o resto dispersou-se, a debandada começou e os lados se confudiram.

Lochart usou a sua altura e a sua força para se afastar para o lado e estava agora entre dois carros, momentaneamente protegido por eles. A poucos metros de distância, ele viu um beco, meio escondido, que levava a uma mesquita onde ele poderia abrigar-se. À sua frente houve uma terrível explosão quando um tanque explodiu e as chamas se espalharam. Os que tiveram sorte morreram na hora, os feridos começaram a gritar. À luz das chamas, ele pensou tê-la visto, então um grupo de estudantes em fuga veio correndo na direção dele, um punho atingiu-lhe as costas, outros o empurraram e ele caiu no chão, sob as botas deles.

Xarazade estava apenas a trinta metros de distância, com os cabelos desgrenhados, as roupas rasgadas, ainda presa no meio da multidão, ainda arrastada pelo tumulto, ainda gritando por socorro, sem que ninguém ouvisse ou se importasse.

— Tommyyyy, ajude-me...

A multidão se separou momentaneamente. Ela correu para a brecha, abrindo caminho em direção às lojas fechadas e aos carros estacionados. O tumulto estava diminuindo. Braços tentavam abrir espaço para respirar, mãos enxugavam o suor e limpavam a sujeira e as pessoas viam quem estava do lado. — Sua comunista filha da puta — o homem que estava na sua frente gritou, com os olhos saltando das órbitas de raiva.

— Não é verdade, eu sou muçulmana — ela gaguejou, mas as mãos dele tinham agarrado a sua jaqueta — o zíper quebrou e ele agarrou-lhe os seios.

— Rameira! Mulheres muçulmanas não se exibem, mulheres muçulmanas usam o chador...

— Eu o perdi. Ele foi arrancado de mim — ela gritou.

— Meretriz! Que Deus a amaldiçoe! As nossas mulheres usam o chador.

— Eu o perdi, ele foi arrancado — ela tornou a gritar e tentou soltar-se. Não há nenhum outro..

— Rameira! Meretriz! Satanista! — ele gritou, sem escutar o que ela dizia, tomado pela fúria e inflamado pelo contato com os seios dela sob a blusa de seda. Ele rasgou o tecido e agarrou-os, com a outra mão tentando estrangulá-la, enquanto ela gritava e chutava. Os que estavam em volta esbarravam neles ou tentavam se afastar, sem conseguir enxergar na escuridão, sem saber o que estava acontecendo, exceto que alguém tinha agarrado uma esquerdista nas fileiras dos crentes.

— Por Deus, ela não é uma esquerdista, eu a ouvi gritando a favor do ímã... — Alguém exclamou, mas sua voz foi abafada pelos gritos, a luta recomeçou e os homens ou avançavam para ajudar ou abriam espaço para recuar e ela ficou a mercê dele.

Ela lutou com unhas, pés e voz, sufocada pelo hálito dele e pelas obscenidades que dizia. Com um último esforço, ela pediu ajuda a Deus e deu um golpe para cima, errou e se lembrou do revólver. Conseguiu agarrá-lo, apontou-o para ele e puxou o gatilho. O homem gritou, com os órgãos genitais esfacelados e caiu no chão, urrando de dor. Houve um silêncio súbito em volta dela. E espaço. Ela tirou a mão do bolso ainda segurando o revólver. Um homem que estava perto dela agarrou-o.

Ela olhou para o seu agressor que gemia e contorcia-se no chão.

— Deus é Grande — ela gaguejou, então notou o estado das suas roupas e fechou a jaqueta, levantou os olhos e viu o ódio em volta dela. — Ele estava me atacando... Deus é Grande, Deus é Grande...

— Ela está dizendo isso da boca para fora, ela é uma esquerdista — gritou uma mulher. — Olhem para as roupas dela, ela não é uma de nós...

A poucos metros de distância, Lochart estava tentando levantar-se, com a cabeça doendo, os ouvidos zumbindo, quase sem poder ver nem ouvir. Com grande esforço, ele ficou em pé, então abriu caminho em direção à escuridão do beco e à sua segurança. Outros tinham tido a mesma idéia e a entrada já estava obstruída. Então a voz dela alcançou-o no meio dos gritos e ele se virou.

Ele a viu acuada, encostada numa parede, cercada por uma multidão, com as roupas rasgadas, a manga da jaqueta arrancada, os olhos arregalados, uma granada na mão. Neste instante, um homem se adiantou, ela tirou o pino da granada, o homem parou, todo mundo começou a recuar, Lochart correu até ela e agarrou a granada, mantendo a alavanca para baixo.

— Afastem-se dela — berrou em farsi e ficou na frente dela, protegendo-a. — Ela é muçulmana, seus filhos de um cão. Ela é muçulmana e é minha esposa e eu sou muçulmano!

— Você é estrangeiro e ela é uma esquerdista.

Lochart deu um soco no homem com o punho protegido pela granada e arrebentou-lhe a boca, quebrando-lhe o maxilar.

— Deus é Grande — Lochart berrou. Outros o acompanharam e aqueles que não acreditaram nele ficaram quietos, com medo dele mas com mais medo ainda da granada. Segurando-a firmemente com o braço livre, quase carregando-a, Lochart foi abrindo caminho, com a granada preparada. — Deixem-nos passar, por favor, Deus é Grande, que a paz esteja com vocês. — Os que estavam na primeira fileira se afastaram, depois os de trás e assim por diante, enquanto ele ia murmurando: — Deus é Grande, que a paz esteja com vocês, até conseguir chegar no beco apinhado de gente, tropeçando no lixo e nos buracos, esbarrando nas pessoas na escuridão. Algumas luzes estavam acesas do lado de fora da mesquita. Na fonte ele parou, quebrou o gelo e com uma das mãos jogou um pouco d'água no rosto, com o cérebro ainda explodindo. — Cristo — murmurou e molhou mais o rosto.

— Oh, Tommyyyy! — exclamou Xarazade, com uma voz fraca e esquisita. — De onde você veio, de onde, oh, eu estava com tanto medo... com tanto medo...

— Eu também — ele gaguejou, quase sem poder falar. — Há horas que estou procurando por você, minha querida. — Ele a abraçou. Você está bem?

— Oh, sim, sim. — Ela se agarrou a ele, enterrando a cabeça no seu ombro.

De repente mais tiros e gritaria. Instintivamente, ele a apertou de encontro a ele, mas não achou que houvesse perigo ali. Apenas vultos passando na semi-escuridão, o tiroteiro cada vez mais distante e o barulho do tumulto diminuindo.

Estamos seguros, finalmente. Não, ainda não, ainda resta a granada — não tem pino para torná-la segura, nada que se possa fazer para isso. Por cima da cabeça dela ele viu um edifício queimado ao lado da mesquita, do outro lado da praça. Eu posso me livrar dela lá, disse a si mesmo, ainda sem conseguir raciocinar com clareza, apertando-a com força e tirando forças deste abraço. A multidão tinha crescido e agora enchia o beco. Até diminuir, seria difícil e perigoso livrar-se da granada, então ele chegou mais perto da fonte, onde estava mais escuro.