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Sim, se houver um Deus, Pettikin pensou, com dor e com frio.

Pouco antes do meio-dia, Rakoczy voltou com seus dois homens. Surpreendentemente, Rakoczy ajudou-o a se levantar e começou a desamarrá-lo.

— Bom dia, capitão Pettikin. Sinto muito pelo engano. Siga-me por favor. — E mostrou o caminho até a sala principal. Havia café na mesa. — Você toma café preto ou ao estilo inglês, com leite e açúcar?

Pettikin esfregava os pulsos doloridos, tentando pôr a mente para funcionar.

— O que é isso? O prisioneiro está recebendo café reforçado?

— Desculpe, mas não entendi.

— Não foi nada. — Pettikin encarou-o, ainda inseguro. — Com leite e açúcar. — O café estava delicioso e revigorou-o. Serviu-se de mais café. — Então foi um engano, foi tudo um engano?

— Sim, eu, hum, eu chequei a sua história e ela confere. Deus seja louvado. Você partirá imediatamente. Voltará para Teerã.

Pettikin sentiu um nó na garganta pela súbita libertação — pelo menos aparente, pensou desconfiado.

— Preciso de combustível. Todo o nosso combustível foi roubado, não há nenhum no depósito.

— Seu aparelho foi reabastecido. Eu mesmo supervisionei isso.

— Você entende de helicópteros? — Pettikin se perguntava por que o homem parecia tão nervoso.

— Um pouco.

— Desculpe, mas eu, hum, eu não sei o seu nome.

— Smith. Sr. Smith. — Fedor Rakoczy sorriu. — Você vai partir agora, por favor. Imediatamente.

Pettikin encontrou suas botas de pilotar e calçou-as. Os outros homens observaram-no em silêncio. Notou que eles usavam metralhadoras soviéticas.

Sobre a mesa, ao lado da porta, estava a sua maleta e, ao lado, os documentos. Passaporte, visto, carteira de trabalho e o DAC iraniano — a licença para pilotar. Tentando não demonstrar seu espanto, certificou-se de que estavam todos lá e enfiou-os no bolso. Quando se dirigiu para a geladeira, um dos homens ficou na frente e fez sinal para que ele se afastasse.

— Estou com fome — Pettikin disse, ainda desconfiado.

— Tem comida no seu helicóptero. Siga-me, por favor.

Lá fora, o ar tinha um cheiro bom, o dia estava frio e bonito, com um céu azul e limpo. Algumas nuvens estavam se formando a oeste. Na direção do leste, a passagem sobre o desfiladeiro estava clara. Em volta dele, a floresta toda cintilava, com a neve refletindo a luminosidade. O 206 estava em frente ao hangar, com as janelas e o pára-brisa limpos. Lá dentro, tudo parecia normal, embora o estojo com o mapa estivesse agora num bolso lateral e não ao lado do seu assento, onde normalmente o deixava. Cuidadosamente, começou a fazer uma checagem pré-decolagem.

— Apresse-se, por favor — disse Rakoczy.

— É claro.

Pettikin fingiu que se apressava, mas não o fez, não deixando escapar nada em sua inspeção, com todos os sentidos alerta para encontrar uma possível sabotagem, fosse sutil ou grosseira. Checou o combustível, o óleo, tudo. Percebeu que os homens estavam ficando cada vez mais nervosos. Ainda não havia ninguém mais na base. No hangar, ele podia ver o 212 com o motor desmontado. As peças que trouxera tinham sido colocadas sobre um banco perto do motor.

— Você já está pronto — Rakoczy disse isso como se fosse uma ordem.

— Entre, você vai reabastecer em Bandar-e Pahlavi como antes. — Ele se virou para os outros, abraçou-os apressadamente e subiu para o assento da direita.

— Decole imediatamente. Vou com você para Teerã. — Colocou a metralhadora entre os joelhos, apertou o cinto, trancou a porta com cuidado, depois apanhou os fones que estavam pendurados atrás dele e colocou-os no ouvido, mostrando claramente que estava acostumado com o interior de uma cabine.

Pettikin notou que os outros dois tinham-se colocado em posições defensivas, de frente para a estrada. Apertou o botão de partida. Logo o barulho, a familiaridade — e o fato de que 'Smith' estava a bordo e portanto era improvável que houvesse sabotagem — fizeram-no sentir-se mais aliviado.

— Lá vamos nós — disse no microfone e decolou deslizando com rapidez, inclinou suavemente o aparelho e subiu rumo ao desfiladeiro.

— Ótimo — disse Rakoczy —, muito bem. Você pilota muito bem. — Como quem não quer nada, colocou a metralhadora sobre os joelhos, com o cano apontando na direção de Pettikin. — Por favor, não pilote bem demais.

— Coloque a trava de segurança, ou não pilotarei de jeito nenhum.

— Concordo que é perigoso durante o vôo. — E Rakoczy colocou a trava depois de alguma hesitação.

A duzentos metros de altura, Pettikin nivelou o aparelho, então inclinou-o de repente e voltou em direção ao campo de pouso.

— O que está fazendo?

— Estou apenas querendo me orientar.

Estava confiando no fato de que embora 'Smith' estivesse familiarizado com uma cabine, não soubesse pilotar um 206, do contrário, ele mesmo o teria levado. Seus olhos procuravam, lá embaixo, um motivo para o nervosismo do homem e para sua pressa em partir. O campo parecia igual. Perto do entroncamento da estradinha estreita da base com a estrada principal, que ia para noroeste em direção a Tabriz, havia dois caminhões. Os dois se dirigiam para a base. Daquela altura, podia ver facilmente que eram caminhões do Exército.

— Vou pousar para ver o que eles querem.

— Se você o fizer — disse Rakoczy, sem demonstrar nenhum temor —, isso vai-lhe custar muita dor e mutilação permanente. Por favor, vá para Teerã... mas primeiro para Bandar-e Pahlavi.

— Qual é o seu nome verdadeiro?

— Smith.

Pettikin deixou as coisas ficarem como estavam, fez uma curva e depois acompanhou a estrada que seguia a direção sudeste para Teerã, rumando para o desfiladeiro e aguardando o momento propício — confiante agora de que em algum lugar, no meio do caminho, ele teria a sua chance.

15

EM TEERÃ: 8:30H. Tom Lochart passou devagar com o seu velho Citroen através dos escombros causados pelos combates noturnos, rumando para Galeg Morghi. A manhã estava gelada e desagradável, e ele já estava atrasado embora tivesse saído de casa antes do amanhecer.

Tinha passado por muitos cadáveres e por pessoas que choravam seus mortos, por muitas carcaças queimadas de carros e caminhões, algumas ainda fumegantes — despojos dos tumultos da noite. Grupos de civis armados ainda dominavam sacadas ou barricadas e ele tivera que fazer muitos desvios. Agora, vários homens usavam a faixa verde de Khomeini no braço. Todos os Faixas Verdes estavam armados. As ruas pareciam agourentamente sem tráfego. De vez em quando, passavam caminhões da polícia com as sirenes ligadas, e também uns poucos carros e caminhões, mas não prestaram nenhuma atenção nele, exceto para buzinar, mandando-o sair da frente, praguejando. Xingou-os de volta, quase sem se importar com o fato de chegar ou não ao aeroporto, pois essa seria a solução perfeita para o seu dilema. Só a idéia da esposa e dos filhos de Valik nas mãos da Savak é que o fazia prosseguir.

Como uma mulher tão maravilhosa quanto Annoush, que sempre fora tão gentil com ele desde que entrara para a família, podia ter-se casado com um filho da mãe daqueles? E como aquelas duas crianças maravilhosas, que adoravam Xarazade e o chamavam de tio Excelência podiam...

Deu uma guinada para evitar um carro que saiu de uma rua lateral na contramão. O carro não parou e ele xingou o carro, Teerã, o Irã e Valik, e disse:

— Insha'Allah — em voz alta, mas isso não ajudou em nada.