— Pelo amor de Deus! — gritou desesperado Pettikin, tentando colocar os fones de ouvido que tinham sido arrancados durante a luta. — Como é que eu posso pilotar com uma arma no pescoço? — A pressão cedeu um pouco e ele endireitou o aparelho. — Quem é você, afinal?
— Smith! — Rakoczy também estava nervoso. Mais um segundo, pensou, e nos teríamos esparramado como um monte de merda. — Você pensa que está lidando com um matyeryebyets amador? — Antes que pudesse se controlar, seus reflexos o levaram a atingir Pettikin na boca.
Pettikin desequilibrou-se com o golpe e o helicóptero balançou mas foi controlado. Sentiu o calor se espalhando pelo rosto.
— Faça isso de novo e eu viro o aparelho de cabeça para baixo — disse com grande decisão.
— De acordo — disse imediatamente Rakoczy. — Peço desculpas por essa... por essa estupidez, capitão. — Cuidadosamente, voltou a se endireitar no assento mas manteve a arma pronta e apontada. — Sim, não havia necessidade disso. Sinto muito.
— Você está se desculpando? — Pettikin encarou-o confuso.
— Sim. Por favor, me desculpe. Eu não sou um bárbaro. — Rakoczy se recompôs. — Se você me der a sua palavra de que vai parar de tentar me atacar, eu largo a arma. Juro que você não corre nenhum perigo.
— Está bem — disse, depois de refletir por um momento. — Se me disser quem você é e o que faz.
— Você me dá a sua palavra?
— Sim.
— Muito bem, eu aceito a sua palavra, capitão. — Rakoczy tornou a travar a arma e guardou-a. — Meu nome é Ali bin Hassan Karakose e eu sou curdo. A minha casa, a minha aldeia, fica na encosta do monte Ararat, na fronteira entre o Irã e a União Soviética. Pela Graça de Deus, sou um Combatente pela Liberdade contra o xá e contra qualquer outra pessoa que queira nos escravizar. Isso o satisfaz?
— Sim. Sim, estou satisfeito. Então se...
— Por favor, mais tarde. Primeiro vá até lá. Depressa. — Rakoczy apontou para baixo. — Desça e chegue mais perto.
Estavam a duzentos e cinqüenta metros, à direita da estrada Qazvin— Teerã. Uma aldeia estendia-se pelos dois lados da estrada um quilômetro para trás e eles podiam ver a fumaça sendo espalhada pelo vento forte.
— Onde?
— Lá, ao lado da estrada.
A princípio, Pettikin não conseguiu ver o que o homem estava apontando, sua mente estava cheia de perguntas a respeito dos curdos e dos seus séculos de guerra contra os xás persas. Então, viu um monte de carros e caminhões parados de um dos lados da estrada, e homens cercando uma caminhonete moderna que tinha uma estrela azul sobre um fundo branco no teto, e o resto do tráfego se arrastando lentamente.
— Você quer dizer lá? Você quer se aproximar daqueles carros e daqueles caminhões? — perguntou, com o rosto ainda ardendo e o pescoço doendo. — Aquele grupo de caminhões perto da caminhonete com a cruz azul no teto?
— Sim.
Obedientemente, Pettikin iniciou a descida.
— O que há de tão importante neles? — perguntou, levantando os olhos. Viu o homem encará-lo com suspeita. — O que é agora?
— Você realmente não sabe o que significa uma cruz azul sobre um fundo branco?
— Não. O que é? — Pettikin olhava para a caminhonete que estava muito mais perto agora, perto o bastante para ver que se tratava de um Range Rover vermelho, cercado por uma multidão enfurecida, e que um dos homens estava arrebentando as janelas traseiras com a coronha de um rifle.
— É a bandeira da Finlândia — ouviu através dos fones e o nome 'Erikki' surgiu em sua mente.
— Erikki tinha um Range Rover — exclamou e viu a janela ser despedaçada. — Você acha que é Erikki?
— Sim... sim, é possível.
Imediatamente, ele desceu e aumentou a velocidade, esquecendo-se da dor, com a excitação sobrepujando todas as perguntas que lhe vieram à cabeça, de como e por que este Combatente pela Liberdade conhecia Erikki. Agora podia ver a multidão se virando para eles e pessoas se dispersando. Passou muito rápido e baixo, mas não conseguiu ver Erikki.
— Conseguiu vê-lo?
— Não. Não pude ver o interior do carro.
— Nem eu — disse ansiosamente Pettikin —, mas alguns daqueles bandidos estão armados e estão quebrando as janelas. Você os viu?
— Sim, devem ser fedayins. Um deles atirou em nós. Se você... Rakoczy parou, segurando-se firme, enquanto o helicóptero fazia uma curva de 180 graus, a cinco metros do chão, e tornava a voltar. Desta vez a multidão fugiu, com as pessoas tropeçando umas nas outras. Os veículos, que trafegavam nas duas direções, tentaram aumentar a velocidade ou pararam subitamente, com um caminhão carregado derrapando e batendo em outro. Vários carros e caminhões saíram da estrada e um deles quase virou dentro do fosso.
Quando estava bem emparelhado com o Range Rover, Pettikin fez uma volta de noventa graus para vê-lo de frente — levantando uma nuvem de neve — por tempo suficiente para reconhecer Erikki, depois fez outra volta de noventa graus para subir.
— É ele mesmo. Você viu os buracos de balas no pára-brisa? — perguntou, chocado. — Pegue a metralhadora aí atrás. Vou firmar o aparelho e depois vamos pegá-lo. Depressa, quero mantê-los atordoados.
Imediatamente, Rakoczy abriu o cinto de segurança, esticou a mão pela janela de comunicação mas não conseguiu apanhar a arma que estava no chão. Com grande dificuldade, ele se virou no assento e engatinhou pela abertura, tentando alcançá-la, e Pettikin viu que o homem estava nas suas mãos. Seria tão fácil abrir a porta e empurrá-lo para fora. Tão fácil. Mas impossível.
— Ande logo! — Gritou e ajudou-o a voltar ao assento. — Coloque o cinto.
Rakoczy obedeceu, tentando recuperar o fôlego, abençoando o fato de Pettikin ser amigo do finlandês, sabendo que se suas posições estivessem invertidas ele não hesitaria em abrir a porta.
— Estou pronto — disse levantando a metralhadora, estarrecido com a burrice de Pettikin. Os ingleses são tão burros que os filhos da mãe merecem perder. — O que...
— Aqui vamos nós! — Pettikin acelerou o aparelho, fazendo a curva e mergulhando. Ainda havia alguns homens armados perto da caminhonete, com as armas apontadas para eles. — Vou amaciá-los e quando eu disser 'fogo' dê uma rajada por cima da cabeça deles!
O Range Rover se aproximou rapidamente, hesitou e depois rodopiou como um bêbado — não havia nenhuma árvore perto — tornou a hesitar e partiu em direção ao helicóptero que dançava em volta deles. Pettikin freou subitamente, a uns vinte metros de distância, a trinta metros do chão.
— Fogo! — ordenou.
Imediatamente, Rakoczy lançou uma rajada de balas pela janela, mirando não acima das cabeças, mas bem no meio de um grupo de homens e mulheres que estavam agachados atrás da caminhonete de Erikki, fora da linha de visão de Pettikin, matando ou ferindo alguns deles. Todos os que estavam perto fugiram em pânico — os gritos dos feridos se misturando ao ronco dos motores.
Motoristas e passageiros saltaram dos carros e caminhões e foram engatinhando pela neve como podiam. Mais uma rajada e mais pânico, agora todo mundo corria para se proteger, e o tráfego estava todo parado. Na estrada, alguns rapazes saíram de trás de um caminhão carregando rifles. Rakoczy atirou neles e nos que estavam perto.
— Faça 360 graus — gritou.
Imediatamente, o helicóptero fez uma piraeta, mas não havia ninguém perto. Pettikin viu quatro corpos na neve.
— Eu disse sobre as cabeças, pelo amor de Deus! — gritou, mas nesse momento a porta do Range Rover se abriu e Erikki saltou, com a faca numa das mãos. Por um momento ficou sozinho, depois uma mulher coberta com o chador apareceu do lado dele. Na mesma hora Pettikin pousou o aparelho mantendo-o quase no ar.
— Venham! — Gritou, acenando para eles. Começaram a correr, com Erikki quase carregando Azadeh, a quem Pettikin ainda não reconhecera.