— O prazer é meu, Louis.
Mary se perguntou como seria sua vida pessoal. Ele era bonito e inteligente, podia ter todas as mulheres que quisesse. Estaria vivendo com alguém?
— Já pensou em casar de novo?
Ela não pôde acreditar que fizera mesmo tal pergunta. Desforges sacudiu a cabeça:
— Não. Se tivesse conhecido minha esposa, poderia compreender. Era uma mulher extraordinária. Ninguém jamais seria capaz de substituí-la.
É assim que me sinto em relação a Edward, pensou Mary. Ninguém jamais será capaz de substituí-lo. Ele fora muito especial. E, no entanto, toda pessoa precisava de uma companhia. Não era uma questão de substituir alguém que fora muito amado. Era descobrir alguém novo para partilhar as coisas. Louis estava dizendo:
— ... e quando me ofereceram a oportunidade, achei que seria interessante conhecer a Romênia. — Ele baixou a voz. — Mas confesso que sinto algo maligno neste país.
— É mesmo?
— Não no povo. O povo é maravilhoso. Mas o governo representa tudo o que desprezo. Não há liberdade para ninguém. Os romenos são praticamente escravos. Se querem ter uma alimentação decente e uns poucos confortos, têm de trabalhar para a Securitate. Os estrangeiros são sistematicamente espionados. — Ele olhou ao redor, a fim de se certificar de que ninguém podia ouvi-los. — Ficarei contente quando meu tempo de serviço terminar e puder voltar à França.
Sem pensar, Mary ouviu-se dizendo:
— Há algumas pessoas que acham que eu deveria voltar para casa.
— Como assim?
E de repente Mary descobriu-se contando toda a história do que acontecera na embaixada.
— Mas isso é horrível! — exclamou Louis. — Tem alguma idéia do responsável?
— Não.
— Posso fazer uma confissão impertinente? Desde que descobri quem você era, andei fazendo algumas indagações a seu respeito. Todos que a conhecem estão muito impressionados com você.
Mary escutava com um profundo interesse. Ele continuou:
— Parece que trouxe para cá a imagem de uma América que é bela, inteligente e afetuosa. Se acredita no que está fazendo, então deve lutar. Deve ficar. Não deixe que ninguém a amedronte.
Era exatamente o que Edward teria dito.
Mary não conseguiu dormir e ficou pensando no que Louis lhe dissera. Ele estava disposto a morrer pelas coisas em que acreditava. E eu? Não quero morrer. E ninguém vai me matar. Ninguém vai me assustar.
Ela continuou na cama, na escuridão total. Apavorada.
Na manhã seguinte Mike Slade entrou em sua sala com duas xícaras de café. Acenou com a cabeça para a parede já limpa e disse:
— Soube que alguém andou escrevendo coisas na sua parede.
— Já descobriram quem foi? Mike tomou um gole do café.
— Não. Verifiquei pessoalmente a lista de visitantes. Todos têm uma justificativa.
— O que significa que deve ter sido alguém da embaixada.
— Ou então alguém que conseguiu passar pelos guardas sem ser visto.
— Acredita mesmo nisso?
Mike pôs a xícara de café na mesa.
— Não.
— Nem eu.
— O que dizia exatamente?
— "Volte para casa antes de morrer." Ele não fez qualquer comentário.
— Quem poderia querer me matar?
— Não sei.
— Senhor Slade, eu agradeceria se me desse uma resposta franca. Acha que corro algum perigo?
Ele estudou-a com uma expressão pensativa.
— Senhora embaixadora, já assassinaram Abraham Lincoln, John Kennedy, Robert Kennedy, Martin Luther King e Marin Groza. Somos dos vulneráveis. A resposta à sua pergunta é sim.
Se acredita no que está fazendo, então deve lutar. Deve ficar. Não deixe que ninguém a amedronte.
24
Às oito e quarenta e cinco da manhã seguinte, quando Mary estava numa reunião, Dorothy Stone entrou correndo na sala e disse:
— As crianças foram seqüestradas! Mary levantou-se de um pulo.
— Deus do céu!
— O alarme da limusine acaba de disparar. Estão localizando o carro agora. Eles não conseguirão escapar.
Mary correu para a sala de comunicações. Meia dúzia de homens estavam parados em torno de um painel de controle. O coronel McKinney falava por um microfone.
— Entendido — disse ele. — Já anotei. Informarei à embaixadora.
— O que está acontecendo? — indagou Mary, a voz rouca, mal conseguindo falar. — Onde estão meus filhos?
O coronel disse, em tom tranqüilizador:
— Estão bem, senhora. Um deles tocou no botão de alarme da limusine por acidente. A luz de emergência no teto acendeu e foi emitido um sinal de SOS em ondas curtas. Antes que o motorista percorresse mais dois quarteirões, foi cercado por quatro carros da polícia, com as sirenes ligadas.
Mary cambaleou contra a parede, aliviada. Não sabia até aquele momento como era grande a sua tensão. E pensou: É fácil compreender por que os estrangeiros que vivem aqui acabam recorrendo aos tóxicos ou à bebida... ou a ligações amorosas.
Mary ficou com as crianças naquela noite. Queria estar o mais perto possível dos filhos. Contemplando-os, pensou: Será que meus filhos correm perigo? Estaremos todos em perigo? Quem poderia querer nos fazer mal? Ela não tinha as respostas.
Três noites depois Mary tornou a jantar com o doutor Louis Desforges. Ele parecia mais relaxado desta vez. Embora persistisse o fundo de tristeza que ela sentira desde o primeiro encontro, ele se empenhou em ser atencioso e divertido. Mary se perguntou se ele sentiria a mesma atração que ela experimentava em relação a ele. Não foi apenas uma tigela de prata que lhe mandei, admitiu para si mesma. Foi também um convite.
Senhora embaixadora é muito formal. Pode me chamar de Mary. Ela estaria mesmo dando em cima daquele homem? E, no entanto... Eu lhe devo muito, possivelmente minha vida. Mas estou racionalizando. Isso não tem nada a ver com o motivo pelo qual desejava vê-lo outra vez.
Eles jantaram cedo no restaurante do terraço do Intercontinental Hotel. Quando Louis a levou de volta à residência oficial, Mary perguntou:
— Não gostaria de entrar?
— Obrigado — respondeu ele. — Será um prazer. As crianças estavam lá embaixo, fazendo os deveres de casa. Mary apresentou-as a Louis. Ele se abaixou na frente de Beth e disse:
— Posso? — Abraçou-a por um instante e depois se empertigou. — Uma das minhas filhas era três anos mais moça do que você. A outra era mais ou menos de sua idade. Eu gostaria de pensar que cresceram para se tornarem tão bonitas quanto você, Beth.
Beth sorriu.
— Obrigada. Mas onde...? Mary apressou-se em dizer:
— Que tal tomarmos todos um chocolate quente? Eles sentaram na enorme cozinha, tomando o chocolate quente e conversando.
As crianças ficaram encantadas com Louis, e Mary pensou que nunca vira um homem com tanta ânsia nos olhos. Ele a esquecera. Estava inteiramente concentrado nas crianças, contando histórias sobre as filhas e anedotas, até que todos riam às gargalhadas.
Já era quase meia-noite quando Mary olhou para o relógio.
— Essa não! — exclamou ela. — Vocês já deveriam estar na cama há várias horas. Vão logo deitar!
Tim aproximou-se de Louis.
— Virá nos visitar de novo?
— Espero que sim, Tim. Depende de sua mãe. Tim virou-se para Mary:
— E então, mamãe?
Ela virou-se para Louis e murmurou:
— Claro que sim.
Mary acompanhou Louis até a porta. Ele pegou-lhe a mão.
— Não tentarei expressar o que esta noite significou para mim, Mary. Não há palavras para isso.