— Nunca fiz uma caçada.
— Talvez um dia eu possa levá-la.
As montanhas à frente pareciam as gravuras que ela conhecia dos Alpes suíços, os picos cobertos por neblina e nuvens. Passavam por florestas e campinas verdejantes, salpicadas de vacas pastando. As nuvens geladas lá em cima eram da cor do aço, e Mary tinha a sensação de que se estendesse a mão e as tocasse elas ficariam grudadas em seus dedos, como metal frio.
A tarde já terminava quando chegaram a seu destino, Sioplea, uma adorável hospedaria na montanha, que parecia um chalé. Mary ficou esperando no carro enquanto Louis registrava os dois.
Um porteiro idoso conduziu-os à suíte. Tinha uma sala de estar confortável, de bom tamanho, mobiliada com simplicidade, um quarto, um banheiro e um terraço, com uma vista espetacular das montanhas.
— Pela primeira vez em minha vida — comentou Louis, suspirando —, eu gostaria de ser um pintor.
— É mesmo uma linda vista. Ele chegou mais perto de Mary.
— Não estou falando da vista. Eu gostaria de pintar você.
Mary descobriu-se pensando: Sinto-me como uma garota de dezessete anos em seu primeiro encontro. Estou nervosa.
Louis abraçou-a e apertou-a. Ela comprimiu a cabeça contra seu peito e no instante seguinte os lábios de Louis se encontraram com os seus. Ele começou a explorar seu corpo e empurrou-lhe a mão para a ereção masculina. Mary esqueceu tudo o mais, exceto o que estava lhe acontecendo agora.
Sentia uma necessidade frenética que ia muito além do sexo. Era a necessidade de que alguém a abraçasse, a tranqüilizasse, a protegesse, fizesse com que soubesse que não estava mais sozinha. Precisava que Louis estivesse dentro dela, estar dentro dele, se tornarem um só.
Estavam na cama de casal e ela sentiu a língua de Louis percorrer seu corpo nu. E depois ele a penetrou e Mary soltou um grito apaixonado, desvairado, antes de explodir em mil gloriosas Marys. E outra vez e outra vez, até que a felicidade tornou-se quase insuportável.
Louis era um amante incrível, ardente e exigente, terno e atencioso. Depois de um longo tempo, eles ficaram imóveis na cama, exaustos, satisfeitos. Mary aninhou-se em seus braços fortes e começaram a conversar.
— É muito estranho — disse Louis. — Eu me sinto inteiro outra vez. Desde que Renée e as crianças morreram, tenho sido como um fantasma, vagueando, perdido.
Eu também, pensou Mary.
— Senti sua falta em todas as coisas importantes e em outras que nunca imaginara. Eu não sabia cozinhar, lavar a roupa ou até fazer a cama direito. Os homens nem pensam nessas coisas.
— Eu também me senti desamparada, Louis. Edward era meu guarda-chuva. Quando começou a chover e ele não estava lá para me proteger, quase me afoguei.
Adormeceram.
Tornaram a fazer amor, agora devagar, com extrema ternura, o fogo abafado, a chama mais lenta, mais requintada.
Era quase perfeito. Quase. Porque havia uma pergunta que Mary queria fazer e sabia que não tinha coragem: Você teve mesmo uma esposa e filhas, Louis?
Tinha certeza de que tudo estaria acabado para sempre entre os dois no instante em que fizesse tal pergunta. Louis nunca a perdoaria por duvidar. Maldito Mike Slade!, pensou ela.
Louis a observava atentamente.
— Em que estava pensando?
— Nada, querido.
O que você estava fazendo naquela ruela escura quando aqueles homens tentaram me seqüestrar, Louis?
Jantaram naquela noite ao ar livre, no terraço. Louis pediu Cemurata, o licor de morango feito nas montanhas próximas.
No sábado subiram numa cremalheira ao pico de uma montanha. Voltaram ao hotel e tomaram banho na piscina coberta, fizeram amor na sauna particular e jogaram bridge com um idoso casal alemão em lua-de-mel.
À noite foram ao Eintrul, um restaurante rústico nas montanhas, onde jantaram numa sala grande, com uma lareira aberta, em que o fogo crepitava. Havia lustres de madeira pendurados do teto e troféus de caça na parede por cima da lareira. A sala era iluminada por velas, e através das janelas podiam contemplar os picos nevados. Um cenário perfeito, numa companhia perfeita.
E logo, muito cedo, estava na hora de partir.
É tempo de voltar ao mundo real, pensou Mary. E o que era o mundo real? Um lugar de ameaças e seqüestros, de coisas horríveis escritas nas paredes de sua sala.
A viagem de volta foi agradável e descontraída. A tensão sexual da ida fora substituída por um sentimento relaxado de união. Louis era uma excelente companhia.
Ao se aproximarem dos arredores de Bucareste, passaram por campos de girassóis, virados na direção do sol.
Eu sou assim, pensou Mary, feliz. Estou me virando para a luz do sol.
Beth e Tim aguardavam ansiosos a volta da mãe.
— Vai casar com Louis? — perguntou Beth. Mary ficou atordoada. Estavam traduzindo em palavras o que ela nem se atrevera a pensar.
— Vai ou não vai?
— Não sei — respondeu ela, com muito cuidado. — Vocês se importariam se eu casasse?
— Ele não é papai — disse Beth —, mas Tim e eu fizemos uma votação. Gostamos dele.
— Eu também — murmurou Mary, satisfeita. — Eu também.
Havia uma dúzia de rosas vermelhas com um bilhete: "Obrigado por você."
Mary leu o cartão. E se perguntou se ele também mandava flores para Renée. E se perguntou se houvera mesmo uma Renée e duas filhas. E odiou a sí mesma por isso. Por que Mike Slade inventaria uma mentira tão terrível? Não havia possibilidade de Mary confirmar. E foi nesse momento que Eddie Maltz, o adido político e homem da CIA, entrou em sua sala.
— Está com uma ótima aparência, senhora embaixadora. Teve um bom fim de semana?
— Tive, sim, obrigada.
Eles passaram algum tempo conversando sobre um coronel que procurara Maltz, revelando sua intenção de desertar.
— Ele seria um trunfo valioso para nós, pois trará algumas informações úteis. Estou enviando um telegrama preto esta noite, mas queria que estivesse preparada para enfrentar a pressão de Ionescu.
— Obrigada, senhor Maltz.
Ele se levantou para sair. Num súbito impulso, Mary acrescentou:
— Espere um instante. Eu... eu poderia lhe pedir um favor?
— Claro.
Ela descobriu de repente que era muito difícil continuar.
— É uma questão... pessoal e confidencial.
— Parece o nosso lema — comentou Maltz, sorrindo.
— Preciso de informações sobre um certo doutor Louis Desforges. Já ouviu falar dele?
— Já, senhora. Ele trabalha na embaixada francesa. O que gostaria de saber a seu respeito?
Seria ainda mais difícil do que ela imaginara. Afinal, era uma traição.
— Eu... eu gostaria de saber se o doutor Desforges foi casado e teve duas filhas. Acha que pode descobrir?
— Uma resposta em 24 horas é suficiente? — indagou Maltz.
— É, sim. Obrigada.
Por favor, Louis, perdoe-me.
Pouco tempo depois Mike Slade entrou na sala de Mary.
— Bom dia.
— Bom dia.
Ele pôs uma xícara de café na mesa. Alguma coisa em sua atitude parecia ter mudado sutilmente. Mary não sabia direito o que era, mas tinha a impressão de que Mike Slade sabia de tudo sobre o seu fim de semana. Ela se perguntou se ele teria espiões a vigiá-la, informando-o de todas as suas atividades.
Ela tomou um gole do café. Excelente, como sempre. Eis uma coisa que Mike Slade faz muito bem, pensou Mary.
— Temos alguns problemas — disse ele.
E pelo resto da manhã ficaram absorvidos numa conversa que incluía mais romenos que queriam emigrar para os Estados Unidos, a crise financeira romena, um fuzileiro que engravidara uma jovem romena e uma dúzia de outros problemas.