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– No final ele aperias bebia – murmurei. Eu não parecia ser capaz de parar de falar, não até que acabasse o que eu pensava ser aquilo tudo. – E da última vez em que o vi, ele estava cego de beber no meio dos cedros e toda vez que eu o via pôr a garrafa na boca, ele não bebia da garrafa, a garrafa é que bebia dele, até que ele ficou todo encolhido, tão enrugado e amarelo que nem os cachorros o conheciam, e tivemos de carregá-lo para fora dos cedros, numa camioneta, para um lugar em Portland, para morrer. Não estou dizendo que eles matam. Eles não o mataram. Eles fizeram outra coisa.

Eu estava com um sono terrível. Não queria falar mais. Tentei lembrar-me do que eu estivera dizendo, e não me pareceu que fosse o que eu tinha querido dizer.

– Estive falando loucuras, não é?

– É, chefe. – Ele se virou na cama. – Esteve falando loucuras.

– Não foi o que eu queria dizer. Não consigo dizer tudo. Não faz sentido.

– Eu não disse que não fazia sentido, chefe. Apenas que eram loucuras.

Ele então ficou em silêncio por tanto tempo que pensei que tivesse dormido. Desejei que lhe tivesse dito boa noite. Olhei para ele, estava virado de costas para mim. O braço dele não estava debaixo das cobertas, e eu podia apenas distinguir os ases e os oito tatuados ali. É grande, pensei, grande como os meus braços costumavam ser quando eu jogava futebol. Eu queria estender a mão e tocar o local das tatuagens, para ter certeza de que ele ainda estava vivo. Ele estava deitado terrivelmente quieto, disse a mim mesmo, eu devia tocar nele para certificar-me de que ainda vivia…

Mentira. Eu sei que ele ainda está vivo. Esta não é a razão por que quero tocar nele.

Quero tocar nele porque ele é um homem.

Isto também é mentira. Há outros homens por aqui. Eu poderia tocar neles.

Eu quero tocar nele porque sou uma dessas bichas!

Mas isso também é mentira. É um medo a esconder-se atrás de outro. Se eu fosse uma bicha, eu quereria fazer outras coisas com ele. Eu só quero tocar nele porque ele é quem ele é.

Mas, quando eu estava a ponto de estender a mão até aquele braço, ele disse:

– Ei, chefe! – Virou-se na cama, com um balanço brusco das cobertas, ficando de frente para mim: – Ei, chefe, por que não vem conosco nessa pescaria, amanhã?

Não respondi. Ele insistiu:

– Vamos, que é que diz? Estou esperando que seja uma ocasião daquelas. Sabe, essas duas tias minhas que vêm me buscar? Ora, não são tias, cara, não; as duas garotas são dançarinas de rebolado que conheço lá de Portland. Que tal?

Finalmente, respondi-lhe que era um dos Indigentes.

– Você é o quê?

– Estou duro.

– Ah – disse ele. – Sim, eu não tinha pensado nisso. Tornou a ficar quieto durante tempo, esfregando a cicatriz no nariz com o dedo. O dedo parou. Ele se levantou apoiado no cotovelo e olhou para mim.

– Chefe – disse devagar, olhando para mim de cima a baixo. – Quando você tinha todo o seu tamanho, quando você media, digamos, mais de dois metros e pesava uns 120 quilos, ou coisa assim… você era forte o bastante para, digamos, levantar uma coisa do tamanho daquele painel de controles na Sala da Banheira?

Pensei a respeito daquele painel. Provavelmente não pesava muito mais do que os tambores de gasolina que eu havia carregado no Exército. Disse a ele que provavelmente teria podido, naquele tempo.

– Se você voltasse a ficar grande assim, ainda poderia levantá-lo?

Disse a ele que achava que sim.

– Para o diabo com o que você acha; eu quero saber se você pode prometer levantar aquilo se eu fizer você ficar grande como era antes. Prometa-me isso e você não somente vai receber o meu curso de desenvolvimento físico gratuito como também vai ganhar uma viagem de pescaria de 10 dólares, grátis! - Ele passou a língua nos lábios e tornou a deitar-se. – Vai dar-me boas perspectivas, também, aposto.

Ficou deitado ali, rindo consigo mesmo, de algum pensamento seu. Quando perguntei-lhe como me faria ficar grande de novo, ele me fez calar levando o dedo aos lábios.

– Cara, não podemos deixar que um segredo desses se espalhe. Èu não disse que lhe diria como, disse? Puxa, cara, fazer um homem voltar a ter todo o seu tamanho é um segredo que não se pode partilhar com todo mundo, seria perigoso nas mãos de um inimigo. Você mesmo não saberá o que está acontecendo a maior parte do tempo. Mas lhe dou a minha palavra de honra, você segue o meu programa de treinamento e verá só o que vai acontecer.

Pôs as pernas para fora da cama e sentou-se na beira, com as mãos nos joelhos. A luz fraca da Sala das Enfermeiras que vinha por sobre o seu ombro apanhou o brilho de seus dentes e um olho cintilante Voltado para mim. A voz galhofeira do vendedor espalhou-se suavemente pelo dormitório.

– Lá estará você. É o Grande Chefe Bromden que vem descendo a avenida. Homens, mulheres e crianças se viram nos calcanhares para olhar para ele: "Ora, ora, ora que gigante é este aqui, com uma passada de três metros e abaixando a cabeça para não bater nos fios telefônicos?" Entra gingando pela cidade, apenas o tempo suficiente para apanhar as virgens, o resto de vocês, gostosas, é melhor nem entrar na fila a menos que tenham peitos grandes como melões, pernas brancas, bonitas e fortes, suficientemente compridas para se enlaçarem em torno das enormes costas dele, e uma pequena taça macia, quente, gostosa e doce como manteiga com mel…

Ali no escuro ele continuou, inventando a sua história de como ia ser, com todos os homens morrendo de medo, e todas as garotas bonitas caídas por mim. Então disse que ia sair naquele exato minuto, e inscrever meu nome como um dos participantes da sua equipe de pescaria. Ele se levantou, apanhou a toalha na cabeceira da cama e a enrolou nos quadris, pôs o gorro e chegou para junto da minha cama.

– Puxa vida, cara, vou lhe contar, no duro, você vai ter mulheres lhe dando rasteira e o derrubando no chão.

De repente sua mão deu um arranco e, com um giro do braço, desamarrou meu lençol, arrancou as cobertas da minha cama e me deixou deitado ali nu.

– Olha aí, chefe. Uau. Que foi que eu lhe disse? Você já cresceu 15 centímetros.

Rindo, ele foi andando pela fileira de camas abaixo, para o corredor.

Duas prostitutas a caminho, vindas de Portland para nos levar para uma pescaria em alto-mar num barco! Aquilo tornava difícil ficar na cama até que as luzes do dormitório se acendessem, às seis e meia.

Fui o primeiro a me levantar, sair do dormitório e olhar a lista pregada no quadro junto da Sala das Enfermeiras, para verificar se meu nome estava realmente escrito ali. INSCRIÇÕES PARA A PESCARIA EM ALTO-MAR, estava escrito em letras grandes no alto da lista. McMurphy havia assinado primeiro, e Billy Bibbit logo em seguida. O número três era Harding, o número quatro, Predrickson, e dali para baixo os números iam até o nove onde ninguém havia assinado ainda. O meu nome era o último escrito, ao lado do número nove. Eu realmente ia sair do hospital com as duas prostitutas, num barco de pesca; eu tinha de ficar repetindo aquilo sem parar, para mim mesmo, para poder acreditar.

Os três crioulos postaram-se na minha frente e leram a lista com os dedos cinzentos, acharam meu nome ali e se viraram para rir de mim.

– Ora, quem você acha que inscreveu o chefe Bromden para essa idiotice? Índios não sabem escrever.

– Que é que lhe dá a idéia de que índios são capazes de ler?

A goma ainda estava fresca e dura o bastante, àquela hora da manhã, de forma que os seus braços farfalhavam nos uniformes brancos, quando eles se moviam, como asas de papel. Fingi que era surdo e que não ouvia que riam de mim, como se eu nem soubesse, mas quando tiraram uma vassoura e me entregaram para que eu fizesse o trabalho deles ali no corredor, dei as costas e voltei para o dormitório, dizendo para mim mesmo "pro inferno com isso". Um cara que vai pescar com duas prostitutas de Portland não tem de engolir aquela porcaria.