Выбрать главу

– Ei, você, lourinha, gosta de garotos bobocas como esses? – Os lábios do homem estavam arroxeados e seu rosto era vermelho sob os olhos, onde o vento havia triturado as veias da superfície. – Ei, você, lourinha – ele continuava gritando repetidamente, numa voz alta e cansada: – ei, você, lourinha… ei, você, lourinha… ei, você, lourinha…

Nós nos agrupamos mais, por causa do vento.

– Diga-me, lourinha, por que é que você foi internada?

– Ahr, ela não foi internada, Perce, ela é parte do tratamento!

– É isso mesmo, lourinha? Você foi contratada como parte do tratamento? Ei, você, lourinha.

Ela levantou a cabeça e nos lançou um olhar que perguntava onde estava aquele grupo esquentado que ela vira, e por que não diziam alguma coisa para defendê-la? Ninguém respondeu ao olhar. Toda a nossa força desafiante havia subido aqueles degraus, com o braço passado em volta do ombro daquele capitão careca.

Ela levantou a gola da jaqueta, apertando-a em volta do pescoço, abraçou os cotovelos e saiu andando pelo ancoradouro para tão longe de nós quanto pôde. Ninguém foi atrás dela. Billy Bibbit tremeu de frio e mordeu o lábio. Os caras da loja de iscas cochicharam alguma outra coisa e se agitaram, dando risadas.

– Pergunte a ela, Perce… ande.

– Ei, lourinha, você conseguiu que assinasse um papel isentando você de responsabilidade junto às autoridades competentes? Estão me dizendo que os parentes poderiam processar, se um dos garotos caísse e se afogasse enquanto estivesse a bordo. Já pensou nisso? Talvez seja melhor você ficar aqui conosco, lourinha.

– É, lourinha, os meus parentes não processariam. Prometo. Fique aqui conosco, lourinha.

Tive a impressão de que podia sentir que meus pés ficavam molhados à medida que o ancoradouro afundava de vergonha na baía. Não estávamos em condições de estar ali fora com gente. Desejei que McMurphy voltasse, xingasse bastante aqueles sujeitos e então nos levasse de volta para o lugar onde devíamos estar.

O homem de lábios arroxeados fechou a faca, levantou-se e limpou os farelos do colo. Começou a andar em direção aos degraus.

– Ora, vamos, lourinha, pra que é que você quer se meter com esses babacas?

Ela se virou e olhou para ele lá da extremidade do ancoradouro, em seguida olhou para nós, e podia-se ver que ela estava pensando na proposta dele quando a porta da loja de iscas se abriu e McMurphy saiu apressadamente. Passando por eles, desceu os degraus.

– Tripulação, embarcar, está tudo resolvido! Combustível e tudo pronto e a bordo há iscas e cerveja.

Ele deu uma palmada no traseiro de Billy, deu uns passos de dança e começou a soltar as cordas de suas amarras.

– O velho Capitão Block ainda está no telefone, mas vamos dar o fora assim que ele sair. George, vamos ver se você consegue esquentar esse motor. Scanlon, você e Harding desamarrem aquela corda ali. Candy! Que diabo você está fazendo aí? Vamos embora, querida, estamos de partida.

Entramos no barco às carreiras, satisfeitos com qualquer coisa que nos levasse para longe daqueles caras enfileirados na loja de iscas. Billy tomou a mão da garota e a ajudou a subir para bordo. George cantarolava sobre o quadro de instrumentos na ponte de comando, mostrando os botões para que McMurphy girasse ou apertasse.

– É esses engulhadores, barquinhos de engulhos, é como os chamamos – disse ele para McMurphy. – São tão fáceis, fáceis como dirigir um carro.

O médico hesitou antes de subir a bordo e olhou em direção à loja onde todos os vagabundos se estavam movendo em círculos em direção aos degraus.

– Não acha, Randle, que seria melhor que esperássemos… até que o capitão…

McMurphy, segurando-o pelas lapelas, levantou-o do ancoradouro, pondo-o dentro do barco como se ele fosse um garotinho.

– Sim, doutor, esperar até que o capitão o quê? - Começou a rir como se estivesse bêbado, falando de maneira agitada e nervosa. – Esperar até que o capitão saia e nos diga que o número de telefone que eu lhe dei é de um bordel em Portland? É claro! Ei, George, anda logo; assuma o comando dessa coisa e nos tire daqui! Sefelt! Solte aquela corda e suba. George, vam'bora!

O motor espocou e morreu, espocou outra vez como se estivesse pigarreando, então rugiu, pegando à toda.

– Ooobaa! Aí vai ele. Dê carvão pra ele, George, e todos os braços a postos para repelir abordagem.

Uma massa branca de fumaça e água ergueu-se da traseira do barco quando a porta da loja de iscas se abriu com estrondo e a cabeça do capitão saiu como uma bala e desceu as escadas como se estivesse arrastando não somente o seu corpo, mas também os dos outros oito vagabundos. Eles vieram correndo pelo ancoradouro e pararam bem no fervilhar de espuma que subia, cobrindo-lhes os pés à medida que George ia virando o grande barco para fora e para longe do ancoradouro, e tínhamos o mar para nós.

Uma guinada repentina no barco atirara Candy de joelhos no chão. Billy a ajudou a levantar-se e tentava ao mesmo tempo desculpar-se pela maneira como havia agido no ancoradouro. McMurphy desceu da ponte de comando e perguntou se eles dois gostariam de ficar a sós de forma que pudessem falar sobre os velhos tempos. Candy olhou para Billy e tudo que ele conseguiu fazer foi sacudir a cabeça e gaguejar. McMurphy disse que nesse caso era melhor que ele e Candy descessem e verificassem se havia vazamentos, e que o resto de nós podia ficar onde estava por enquanto. Ele ficou na porta da cabina, bateu uma continência, piscou, e nomeou George comandante e Harding imediato.

– Continuem, marujos – disse e seguiu a garota para o interior da cabina.

O vento amainou e o sol ficou mais alto, cromando de prateado o lado leste das vagas verde-escuras. George dirigiu o barco direto para o mar, a toda velocidade, fazendo com que o ancoradouro e a loja de iscas ficassem cada vez mais para trás. Quando passamos pelo último ponto do quebra-mar e pela última rocha negra, pude sentir que uma enorme calma descia sobre mim, uma calma que foi aumentando quanto mais nos afastávamos da terra.

Haviam discutido animadamente durante alguns minutos sobre nosso ato de pirataria quanto à posse do barco, mas agora todos estavam quietos. A porta da cabina se abriu uma vez, por tempo suficiente para que uma mão empurrasse para fora um caixote de cerveja. Billy abriu uma cerveja para cada um com um abridor que encontrou na caixa de equipamentos, e foi passando adiante. Bebemos e observamos a terra ir afundando na nossa esteira.

A uma milha da costa, mais ou menos, George diminuiu a marcha para o que ele chamou de giro preguiçoso, pôs quatro homens nas quatro varas na traseira do barco, e o resto de nós se esparramou sob o sol no teto da cabina ou lá em cima na proa. Tiramos a camisa e ficamos observando os quatro tentarem mastrear as varas. Harding disse que, pelo regulamento, cada homem ficaria com uma vara até que acertasse um, então tinha de trocar com outro que ainda não tivesse tido uma oportunidade. George ficou no leme, olhando para fora, pela vidraça manchada de sal, e berrava instruções sobre como ajustar as carretilhas e linhas e como prender um arenque no anzol, e a que distância e profundidade pescar.

– E pegue aquela vara número quatro e acrescente 350 gramas nela com um cabo que tenha uma carretilha de correr, – mostro pra vocês daqui a um minuto – e vamos sair atrás desse grandalhão até lá no fundo com essa vara, puxa vida!

Martini correu até a beira e inclinou-se sobre a amurada, olhando fixo para a água, na direção da sua linha.