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“Ainda não posso morrer. Eu não vi Sonhos dourados.”

Foram oito anos depois do dia em que Thomas Wolfe morreu, mas era seu tipo de dia. Por todo o território dos Estados Unidos e todo o hemisfério norte era um daqueles dias em que o verão cede espaço, quando o clima vem novamente dos polos e do Canadá em vez de do Golfo e do Pacífico.

Acabaram construindo um monumento para Jetboy – “o garoto que ainda não podia morrer”. Um veterano calejado de batalha, com 19 anos, que havia impedido um louco de explodir Manhattan. Depois que cabeças mais tranquilas prevaleceram, eles compreenderam isso.

Mas demorou um pouco para que se lembrassem. E para voltar a estudar ou comprar aquela geladeira nova. Demorou muito tempo para alguém se lembrar de como tudo era antes de 15 de setembro de 1946.

Quando as pessoas em Nova York olharam para cima e viram Jetboy explodir a aeronave agressora, pensaram que seus problemas haviam terminado. Elas estavam tão erradas quanto cobras em uma rodovia de oito pistas.

– Daniel Deck

Godot é meu copiloto:

Uma vida de Jetboy

Lippincott, 1963

Do alto do céu a névoa fina começou a cair.

Parte dela se espalhou com o vento, seguindo a corrente, na direção leste.

Sob aquelas correntes, a névoa se reagrupou e pairou como chuva que evapora, lentamente assentando sobre a cidade abaixo, faixas se formando e reformando, se rompendo como nuvens perto de uma tempestade.

Onde quer que tenha caído, produziu um som como de uma suave chuva de outono.

O dorminhoco

Roger Zelazny

1 – A longa caminhada para casa

Ele tinha 14 anos de idade quando o sono se tornou seu inimigo, uma coisa sombria e terrível que aprendeu a temer como outros temiam a morte. Mas não era uma questão de neurose em qualquer de suas mais misteriosas formas. Em geral uma neurose tem elementos irracionais, enquanto seu medo vinha de uma causa específica e seguia um rumo tão lógico quanto um teorema de geometria.

Não que não houvesse irracionalidade em sua vida. Muito pelo contrário. Mas isso era uma consequência, e não a causa, de seu quadro. Pelo menos foi o que disse a si mesmo mais tarde.

Resumindo, o sono era sua ruína, sua nêmese. Era seu inferno em prestações.

Croyd Crenson havia concluído oito séries na escola e não conseguiu passar pela nona. Não foi por qualquer falha sua. Embora não fosse dos primeiros da turma, também não era dos últimos. Era um garoto comum, com um corpo comum, rosto sardento, olhos azuis e cabelos castanhos lisos. Gostava de brincar de guerra com os amigos até a guerra de verdade terminar; depois passaram a brincar cada vez mais de polícia e ladrão. Quando era guerra ele esperava – não com muita paciência – por sua oportunidade de ser o grande piloto de caça Jetboy; depois da guerra, em polícia e ladrão, ele normalmente era um ladrão.

Ele começou a nona série, mas, como muitos outros, nunca passou do primeiro mês: setembro de 1946...

– Está olhando o quê?

Ele se lembrava da pergunta da Srta. Marston, mas não de sua expressão, porque não se virara do espetáculo. Não era incomum os garotos de sua sala olharem pela janela com frequência cada vez maior assim que as três horas da tarde chegavam a uma distância crível. Mas era incomum não se virarem rapidamente quando chamados, simulando mais um pouco de atenção enquanto esperavam pelo sinal do final da aula.

Em vez disso ele respondeu:

– Os balões.

Como três outros garotos e duas meninas que também tinham uma boa linha de visão estavam olhando na mesma direção, a Srta. Marston – sua própria curiosidade despertada – foi até a janela. Parou lá e olhou.

Eles estavam bem no alto – cinco ou seis deles, aparentemente –, coisinhas pequenas no final de um corredor de nuvens, se deslocando como se unidos. E havia um avião na vizinhança, fazendo uma passagem rápida por eles. Lembranças em preto e branco de cinejornais, ainda frescas, vieram à mente. Realmente parecia que o avião estava atacando os peixes prateados.

A Srta. Marston observou por algum tempo, depois se virou.

– Certo, turma – começou. – É apenas...

Então as sirenes soaram. A Srta. Marston sentiu os ombros subindo e enrijecendo involuntariamente.

– Ataque aéreo! – gritou uma garota chamada Charlotte na primeira fila.

– Não é – disse Jimmy Walker, o aparelho nos dentes cintilando. – Não tem mais. A guerra acabou.

– Eu sei como eles soam – disse Charlotte. – Sempre que havia um blecaute...

– Mas não tem mais guerra – afirmou Bobby Tremson.

– Agora já chega, turma – disse a Srta. Marston. – Eles talvez estejam fazendo um treinamento.

Mas ela olhou novamente pela janela e viu um pequeno clarão de fogo no céu antes de uma barreira de nuvens bloquear sua visão do combate aéreo.

– Fiquem em seus lugares – disse, enquanto vários alunos se levantavam e iam na direção da janela. – Vou conferir na secretaria e descobrir se há algum treinamento que não foi anunciado. Volto logo. Podem conversar se for em voz baixa.

Ela saiu, batendo a porta após passar. Croyd continuou a olhar para a cortina de nuvens, esperando que se abrisse novamente.

– É Jetboy – disse a Bobby Tremson da outra fileira.

– Ah, até parece – respondeu Bobby. – O que estaria fazendo lá em cima? A guerra acabou.

– É um avião a jato. Vi nos noticiários, e é assim que funciona. E ele é o melhor.

– Você está inventando tudo isso – disse Liza do fundo da sala.

Croyd deu de ombros.

– Tem alguém mau lá em cima, e ele está lutando contra – disse. – Eu vi o fogo. Há tiros.

As sirenes continuavam a berrar. Da rua do lado de fora subiram sons de pneus travando, seguidos pelo som breve de uma buzina de carro e o baque surdo de uma colisão.

– Acidente! – gritou Bobby, e todos se levantaram e foram para a janela.

Croyd então se levantou, não querendo ter a visão bloqueada; e como estava perto, conseguiu um bom lugar. Mas não olhou para o acidente, continuou a fitar o céu.

– Entrou no porta-malas – disse Joe Sarzanno.

– O quê? – perguntou uma garota.

Croyd então ouviu as explosões distantes. O avião não era mais visto.

– Que barulho é esse? – perguntou Bobby.

– Fogo antiaéreo – respondeu Croyd.

– Você está maluco!

– Eles estão tentando derrubar a coisa, o que quer que seja.

– É. Claro. Como nos filmes.

As nuvens começaram a se fechar novamente. Mas enquanto isso acontecia Croyd achou ter vislumbrado o jato novamente, indo em rota de colisão contra os balões. Sua visão então foi bloqueada antes que pudesse ter certeza.

– Droga! – falou. – Pega eles, Jetboy!

Bobby riu e Croyd o empurrou com força.

– Ei! Cuidado com quem está empurrando!

Croyd se virou para ele, mas Bobby parecia não querer continuar com a confusão. Estava olhando para a janela novamente, apontando.

– Por que todas aquelas pessoas estão correndo?

– Não sei.

– É o acidente?

– Não.

– Olha! Mais um!

Um Studebaker azul havia feito a curva rápido, desviado para não acertar os carros parados e batido em um Ford que se aproximava. Os dois carros ficaram inclinados. Outros veículos frearam e pararam para não bater neles. Várias buzinas começaram a soar. Os sons abafados da defesa antiaérea continuaram em meio ao uivo das sirenes. As pessoas agora estavam correndo pelas ruas, sequer parando para olhar os acidentes.

– Acha que a guerra recomeçou? – perguntou Charlotte.

– Não sei – disse Leo.