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– Ah, estou me estabelecendo agora. Está melhor do que no começo.

– Bom. E Claudia?

– Bom que tenha aparecido agora. Ela não sabia para onde enviar o convite.

– Qual convite?

– Ela se casa no sábado.

– Aquele cara de Jersey?

– É. Sam. Aquele do qual estava noiva. Ele administra um negócio de família. Ganha um bom dinheiro.

– Onde será o casamento?

– Em Ridgewood. Você vai comigo. Eu vou de carro.

– Certo. De que tipo de presente gostariam?

– Eles fizeram uma lista. Você encontra.

– Bom.

Croyd saiu naquela tarde e comprou um televisor Dumont com tela de 16 polegadas, pagou em dinheiro e mandou que fosse entregue em Ridgewood. Depois visitou Bentley, mas recusou um serviço que soava arriscado por causa de sua aparente falta de talentos especiais dessa vez. Na verdade, era uma boa desculpa. Não queria realmente trabalhar, correr o risco de se ferrar – fisicamente ou com a lei – tão perto do casamento.

Jantou com Bentley em um restaurante italiano e depois ficaram várias horas bebendo uma garrafa de Chianti, falando de trabalho e pensando no futuro enquanto Bentley tentava lhe explicar o valor da solvência a longo prazo e de um dia se tornar respeitável – algo que ele mesmo nunca havia conseguido direito.

Depois disso, caminhou a maior parte da noite, para praticar estudando prédios em busca de pontos fracos, para pensar sobre sua família mudada. Em algum momento depois da meia-noite, quando passava por Central Park West, uma forte coceira começou em seu peito e se espalhou pelo corpo todo. Após um minuto ele teve de parar e se coçar violentamente. Alergias estavam entrando na moda na época e ele se perguntou se sua nova encarnação o dera uma sensibilidade a algo no parque.

Seguiu para oeste na primeira oportunidade e saiu da região o mais rápido possível. Após uns dez minutos a coceira diminuiu. Em meia hora, havia desaparecido completamente. Mas suas mãos e o rosto pareciam ásperos.

Por volta de quatro da manhã parou em um restaurante 24 horas perto da Times Square, onde comeu lenta e constantemente e leu um exemplar da revista Time que alguém deixou em um reservado. A seção médica tinha um artigo sobre suicídio entre curingas, o que o deprimiu consideravelmente. As citações que trazia o fizeram se lembrar de coisas que ouvira serem ditas por muitas pessoas que conhecia, levando-o a pensar se algumas delas estariam entre os entrevistados. Ele compreendia muito bem os sentimentos, embora não pudesse partilhá-los, sabendo que não importava o que tirasse, sempre receberia outra carta selvagem na vez seguinte – e que com maior frequência não era um ás.

Todas as suas articulações rangeram quando se levantou e ele sentiu uma dor penetrante entre as omoplatas. Seus pés também pareciam inchados.

Voltou para casa antes do amanhecer, se sentindo febril. No banheiro, encharcou uma toalha para colocar sobre a testa. Notou no espelho que o rosto parecia inchado. Ele se sentou na poltrona do quarto até ouvir Carl e Claudia se movimentando. Quando se levantou para tomar café com eles, seus membros pareciam de chumbo, e as articulações rangeram novamente enquanto descia a escada.

Claudia, magra e loura, o abraçou quando entrou na cozinha. Depois estudou seu novo rosto.

– Você parece cansado, Croyd – disse.

– Não diga isso – retrucou. – Não posso ficar cansado tão cedo. Faltam dois dias para seu casamento e vou chegar lá.

– Mas você pode descansar sem dormir, não pode?

Ele assentiu com a cabeça.

– Então relaxe. Sei que deve ser difícil... Venha, vamos comer.

Enquanto tomavam o café, Carl perguntou:

– Quer ir ao escritório comigo conhecer o espaço?

– Outra hora – respondeu Croyd. – Tenho umas coisas a fazer.

– Claro. Talvez amanhã.

– Talvez.

Carl saiu pouco depois disso. Claudia encheu novamente a xícara de Croyd.

– Nós quase não o vemos mais – disse ela.

– É. Bem, você sabe como é. Eu durmo; às vezes meses. Quando acordo, nem sempre estou bonito. Em outras vezes tenho de dar um jeito de pagar as contas.

– Apreciamos isso – disse ela. – É difícil entender. Você era o garotinho, mas agora parece um homem crescido. Você se comporta como um. Não teve direito a uma infância inteira.

Ele riu.

– E o que você é, uma senhora? Tem apenas 17 e vai se casar.

Ela riu de volta.

– Ele é um cara legal, Croyd. Sei que vamos ser felizes.

– Bom. Espero que sim. Escute, se um dia quiser me encontrar, vou dar a você o nome de um lugar onde pode deixar uma mensagem. Mas nem sempre posso ser rápido.

– Entendo. O que você faz, aliás?

– Fiz uma série de coisas diferentes. No momento estou indo de uma coisa para outra. Estou devagar dessa vez por causa do seu casamento. E como ele é?

– Ah, muito respeitável e correto. Estudou em Princeton. Foi capitão do Exército.

– Europa? Pacífico?

– Washington.

– Ah. Boas ligações.

Ela fez que sim com a cabeça.

– Família tradicional – acrescentou.

– Bem... Que bom – opinou ele. – Você sabe que quero que seja feliz.

Ela se levantou e o abraçou novamente.

– Senti sua falta – disse ela.

– Eu também.

– Agora tenho coisas a fazer. Vejo você mais tarde.

– Sim.

– Vá devagar hoje.

Quando ela saiu, ele esticou os braços ao máximo tentando aliviar a dor nos ombros. Sua camisa rasgou atrás quando fez isso. Ele se olhou no espelho do corredor. Seus ombros estavam mais largos hoje do que ontem. De fato, seu corpo inteiro parecia mais largo, forte. Ele retornou ao quarto e se despiu. A maior parte do tronco estava coberta por uma irritação vermelha. A simples visão dava vontade de coçar, mas ele se conteve. Em vez disso encheu a banheira e ficou afundado nela por um bom tempo. O nível da água diminuíra visivelmente no momento em que saiu. Quando se examinou no espelho do banheiro, parecia ainda maior. Será que ele teria absorvido parte da água através da pele? De qualquer forma a inflamação parecia ter desaparecido, embora sua pele ainda estivesse áspera nos pontos em que havia ficado inchada.

Vestiu roupas que sobraram de uma vez anterior em que fora maior. Depois saiu e foi de metrô até a loja de roupas que visitou no dia anterior. Lá ele se trocou completamente e retornou, sentindo-se ligeiramente nauseado enquanto o vagão balançava e sacudia. Notou que as mãos pareciam secas e ásperas. Quando as esfregou, cascas de pele morta caíram como caspa.

Ao sair do metrô, caminhou até chegar ao prédio dos Sarzanno. Mas a mulher que abriu a porta não era Rose, mãe de Joe.

– O que quer? – perguntou.

– Estou procurando por Joe Sarzanno.

– Não há ninguém aqui com esse nome. Deve ser alguém que se mudou antes de virmos para cá.

– Então não sabe para onde eles foram?

– Não. Pergunte ao zelador. Talvez ele saiba.

Ela fechou a porta.

Ele tentou o apartamento do zelador, mas ninguém atendeu. Então foi para casa, se sentindo pesado e inchado. Na segunda vez que bocejou, sentiu um medo repentino. Parecia cedo demais para voltar a dormir. Aquela transformação era mais perturbadora que de hábito.

Ele colocou um bule de café novo no fogão e andou de um lado para o outro esperando que filtrasse. Embora não houvesse certeza de que acordaria com algum poder especial a cada ocasião, a única coisa que havia sido constante era a mudança. Ele pensou em todas as mudanças pelas quais passara desde que tinha sido infectado. Aquela era a única em que não parecia nem curinga nem ás, mas normal. Ainda assim...

Quando o café ficou pronto ele se sentou com uma xícara e se deu conta de que estivera coçando a coxa direita quase inconscientemente. Esfregou as mãos e mais pele seca descascou. Pensou em seu diâmetro aumentado. Pensou em todas as pequenas dores e rangidos, na fadiga. Era óbvio que ele não era completamente normal dessa vez, mas não estava certo de o que exatamente seria aquela anormalidade. Será que o Dr. Tachyon poderia ajudá-lo? Ou pelo menos lhe dar alguma ideia do que estava acontecendo?