Croyd encontrou um restaurante escuro e deu algum dinheiro ao garçom para que os colocasse em um reservado nos fundos, fora da vista da maioria dos outros fregueses.
– Croyd, você realmente está parecendo... indisposto – disse Claudia mais cedo, quando ele voltou.
– Eu sei – respondeu. – Fui ao médico esta tarde.
– O que ele disse?
– Que vou precisar de muito sono, logo depois do casamento.
– Croyd, se quiser faltar, eu entendo. Sua saúde em primeiro lugar.
– Não quero faltar. Ficarei bem.
Como podia dizer a ela quando ele mesmo não entendia completamente? Dizer que era mais do que o casamento de sua parente preferida – que a ocasião representava a dissolução final de seu lar e que era improvável que um dia tivesse outro? Dizer que aquilo era o fim de uma fase de sua existência e o começo de um grande desconhecido?
Em vez disso ele comeu. Seu apetite não diminuiu e a comida era particularmente boa. Carl assistiu com o fascínio de um voyeur, muito após ele ter terminado sua própria refeição, enquanto Croyd dava cabo de mais dois Chateaubriand para dois, parando apenas para pedir mais cestinhas de pão.
Quando enfim se levantaram, as articulações de Croyd estavam rangendo novamente.
Naquela noite ele se sentou na cama, sentindo dores. As aspirinas não estavam adiantando. Ele havia retirado suas roupas porque sentia todas apertadas novamente. Sempre que se coçava, a pele fazia mais do que escamar. Grandes pedaços dela caíam, mas eram secos e claros, sem sinal de sangue. Não espantava que parecesse pálido, decidiu. No fundo de uma abertura particularmente grande no peito ele viu algo cinza e duro. Não conseguiu descobrir o que era, mas sua presença o assustou.
Finalmente, apesar da hora, telefonou para Bentley. Tinha de falar com alguém que soubesse de sua situação. E Bentley costumava dar bons conselhos.
Bentley atendeu após vários toques e Croyd contou sua história.
– Sabe o que eu penso, garoto? – disse Bentley enfim. – Você devia fazer o que o médico mandou. Dormir.
– Não posso. Ainda não. Só preciso de pouco mais que um dia. Depois ficará tudo bem. Consigo ficar acordado até lá, mas está doendo demais, e minha aparência...
– Tá legal, tá legal. Olha o que vou fazer. Você aparece aqui lá pelas dez da manhã. Não posso fazer nada por você agora. Mas logo cedo vou falar com um homem que conheço e te arrumar um analgésico realmente forte. E quero dar uma olhada em você. Talvez haja algum meio de melhorar um pouco sua aparência.
– Certo. Obrigado, Bentley. Fico muito grato.
– Tudo bem. Eu entendo. Também não foi divertido ser um cachorro. Boa noite.
– Noite.
Duas horas depois, Croyd sentiu cólicas terríveis, seguidas por diarreia; sua bexiga também pareceu que iria explodir. Isso continuou a noite toda. Quando ele se pesou às três e meia, havia caído para 125 quilos. Às seis, pesava 109. Gorgolejava constantemente. A única vantagem, refletiu, era que isso desviava a atenção da coceira e das dores nos ombros e articulações. E também era suficiente para mantê-lo acordado sem anfetaminas adicionais.
Às oito horas ele pesava 98 quilos e se deu conta – quando Carl o chamou – de que finalmente havia perdido o apetite. Estranhamente, sua cintura não havia diminuído nada. A estrutura do corpo em geral estava inalterada desde o dia anterior, embora naquele momento estivesse pálido quase ao ponto do albinismo – e isso, somado aos dentes proeminentes, dava-lhe a aparência de um vampiro gordo.
Às nove horas ele ligou para Bentley, pois continuava gorgolejando e correndo para o banheiro. Contou que estava com diarreia e não podia ir pegar o remédio. Bentley disse que ele mesmo levaria assim que o homem o entregasse. Carl e Claudia já haviam saído para cuidar de suas vidas. Croyd os evitou naquela manhã, alegando não estar bem do estômago. Pesava 89.
Eram quase 11 horas quando Bentley apareceu. A essa altura Croyd havia perdido mais nove quilos e arrancado um grande pedaço de pele do abdômen inferior. A área de tecido exposto abaixo era cinzenta e escamosa.
– Meu Deus! – disse Bentley quando o viu.
– É.
– Você está careca em grandes áreas.
– Certo.
– Vou conseguir uma peruca. Também vou falar com uma mulher que conheço. Ela é esteticista. Vamos arranjar algum creme para passar. Dar a você uma cor normal. Acho que também seria melhor usar óculos escuros quando for ao casamento. Diga a eles que está com conjuntivite. Você também está ficando corcunda. Quando isso aconteceu?
– Sequer percebi. Eu estive... Ocupado.
Bentley deu um tapinha no calombo entre os ombros dele e Croyd berrou.
– Desculpe. Talvez fosse melhor você tomar um comprimido imediatamente.
– É.
– Você também vai precisar de um grande sobretudo. Qual o seu tamanho?
– Não sei... Agora.
– Tudo bem. Conheço alguém que tem um armazém cheio. Vou mandar uma dúzia.
– Tenho de correr, Bentley. Estou gorgolejando novamente.
– É. Tome seu remédio e tente descansar.
Às duas horas Croyd pesava 70 quilos. O analgésico funcionara e ele estava sem dores pela primeira vez em muito tempo. Infelizmente, isso também o deixou sonolento, e ele teve de tomar anfetaminas mais uma vez. Em compensação, essa combinação lhe deu a primeira sensação boa desde que tudo havia começado, mesmo sabendo que era falsa.
Quando o carregamento de casacos foi entregue às três e meia, ele havia caído para 61 quilos e se sentia muito leve. Em algum lugar no fundo do corpo seu sangue parecia estar cantando. Encontrou um casaco que se ajustava perfeitamente e o levou para o quarto, deixando os outros no sofá. A esteticista – uma loura alta cheia de laquê e que mascava chicletes – apareceu às quatro horas. Arrancou a maior parte do seu cabelo com um pente, raspou o restante e ajustou uma peruca. Depois maquiou o rosto, orientando-o sobre o uso dos cosméticos enquanto o fazia. Também recomendou que mantivesse a boca fechada o máximo possível para esconder as presas. Ele ficou contente com o resultado e lhe deu cem dólares. Ela então observou que havia outros serviços que poderia prestar, mas ele estava novamente gorgolejando e lhe desejou boa-tarde.
Às seis horas suas entranhas começaram a se acalmar. Ele fora reduzido a 52 e ainda se sentia muito bem. A coceira também finalmente havia parado, embora ele tivesse arrancado mais pele de tórax, antebraços e coxas.
Quando Carl chegou, gritou para o andar de cima.
– Que porra todos esses casacos estão fazendo aqui?
– É uma longa história – respondeu Croyd. – Pode ficar com eles se quiser.
– Ei, são de casimira!
– É.
– Este é do meu tamanho.
– Então fique com ele.
– Como está se sentindo?
– Melhor, obrigado.
Naquela noite ele sentiu sua força retornar e deu uma de suas longas caminhadas. Levantou bem alto a parte dianteira de um carro estacionado para testar. Sim, parecia estar se recuperando. Com os cabelos e a maquiagem, tinha a aparência de um gordo comum, desde que ficasse de boca fechada. Se tivesse um pouco mais de tempo teria procurado um dentista para fazer algo em relação às presas. Não comeu nada naquela noite ou de manhã. Sentia uma pressão peculiar nas laterais da cabeça, mas tomou outro comprimido e isso não se transformou em dor.
Antes que ele e Carl partissem para Ridgewood, Croyd se permitira outro banho de imersão. Mais pele caíra, mas estava tudo bem. As roupas cobririam seu corpo de retalhos. Pelo menos o rosto havia permanecido intacto. Fez a maquiagem cuidadosamente e ajustou a peruca. Quando estava totalmente vestido e havia colocado óculos de sol, achou que parecia apresentável. E o sobretudo minimizava um pouco o calombo nas costas.
A manhã estava fresca e nublada. O problema intestinal parecia ter terminado. Tomou outro comprimido como profilaxia, sem saber se realmente havia mais alguma dor a ser escondida. Isso tornou necessário outra anfetamina. Mas tudo bem. Ele se sentia bem, embora um tanto nervoso.