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Enquanto passavam pelo túnel, ele se viu esfregando as mãos. Para seu desalento, um grande pedaço de pele se soltou nas costas da mão esquerda. Mas mesmo isso não era problema. Ele se lembrou de levar luvas.

Não sabia se era a pressão no túnel, mas sua cabeça estava começando a latejar novamente. Não era uma sensação dolorosa, meramente uma pressão pesada nos ouvidos e nas têmporas. O alto das costas também latejava e havia um movimento dentro. Ele mordeu o lábio e um pedaço dele se soltou. Ele xingou.

– Qual o problema? – perguntou o irmão.

– Nada.

Pelo menos não estava sangrando.

– Se você está doente, posso levá-lo de volta. Odeio que esteja indo doente ao casamento. Especialmente com um bando pomposo como a turma de Sam.

– Ficarei bem.

Ele se sentia leve. Sentia a pressão em muitos pontos dentro do corpo. A sensação de força da droga se sobrepunha à sua verdadeira força. Tudo parecia correr perfeitamente. Ele cantarolou uma canção e tamborilou sobre o joelho.

– ... casacos devem valer bastante – Carl estava dizendo. – São todos novos.

– Venda em algum lugar e fique com o dinheiro – ele se ouviu dizer.

– São roubados?

– Provavelmente.

– Você está no crime, Croyd?

– Não, mas conheço pessoas.

– Vou ficar quieto.

– Ótimo.

– Mas você está bem no papel, sabe? Com esse casaco preto e os óculos.

Croyd não respondeu. Estava escutando seu corpo, que lhe dizia que algo se soltava em suas costas. Esfregou os ombros no encosto do banco. Isso fez com que se sentisse melhor.

Quando foi apresentado aos pais de Sam, William e Marcia Kendall – um homem grisalho de aparência rude, um pouco mais para o gordo, e uma loura conservada –, Croyd se lembrou de sorrir sem abrir a boca e fazer seus poucos comentários quase sem mover os lábios. Pareceram estudá-lo cuidadosamente, e ele teve certeza de que tinham mais a dizer, só que outros esperavam para ser cumprimentados.

– Quero conversar com você na recepção – foram as últimas palavras de William.

Croyd suspirou enquanto se afastava. Havia passado. Não tinha intenção alguma de ir à recepção. Estaria em um táxi voltando para Manhattan assim que a cerimônia religiosa terminasse, estaria dormindo em questão de horas. Sam e Claudia provavelmente estariam nas Bahamas antes que ele acordasse.

Viu seu primo Michael, de Newark, e quase o abordou. Ao inferno com isso. Teria de explicar sua aparência e não valia a pena. Entrou na igreja e foi levado a um banco na frente, à direita. Carl conduziria Claudia. Pelo menos havia acordado tarde demais para ser escolhido como escudeiro. Era preciso reconhecer que tinha timing.

Enquanto esperava o início da cerimônia, começou a observar a decoração do altar, os vitrais dos dois lados, os arranjos de flores. Outras pessoas entraram e foram acomodadas. Ele se deu conta de que suava. Olhou ao redor. Era o único vestindo sobretudo. Pensou se os outros achariam aquilo estranho. Pensou se a transpiração estava fazendo a maquiagem escorrer. Desabotoou o casaco e o deixou aberto.

O suor continuou e seus pés começaram a doer. Finalmente ele se inclinou para a frente e afrouxou os cadarços. Ao fazer isso ouviu a camisa se rasgar nas costas. Algo parecia ter se soltado ainda mais ao redor dos ombros. Outro pedaço de pele, imaginou. Quando se ajeitou sentiu uma dor penetrante. Não conseguiu se recostar novamente no banco. Seu calombo parecia ter aumentado e qualquer pressão era dolorosa. Então assumiu uma posição projetada para a frente, levemente curvado, como se rezasse. O organista começou a tocar. Mais pessoas entraram e foram acomodadas. Um acompanhante passou com um casal idoso por sua fila e lhe lançou um estranho olhar no caminho.

Logo todos estavam sentados e Croyd continuava a suar. Escorria pelo lado do corpo e pelas pernas, era absorvido pelas roupas, que ficaram marcadas e depois encharcadas. Decidiu que poderia ficar mais fresco se tirasse os braços das mangas do casaco e o deixasse apenas pendurado nos ombros. Isso foi um erro, pois enquanto se esforçava para soltar os braços ouviu os trajes se rasgando em vários outros pontos. Seu sapato esquerdo se rasgou de repente e dedos cinzentos se projetaram pelas laterais. Algumas pessoas olharam na sua direção quando ocorreram esses sons. Ele ficou grato por ser incapaz de corar.

Não sabia se foi o calor ou algo psicológico que deflagrou a coceira novamente. Não que importasse. Era coceira de verdade, independentemente do que havia causado. Ele tinha analgésicos e anfetaminas no bolso, mas nada para irritação de pele. Cruzou as mãos com força, não para rezar, mas para se impedir de coçar – embora também tenha feito uma prece, já que as circunstâncias pareciam apropriadas. Não adiantou.

Viu o padre entrar, por entre cílios cobertos de transpiração. Ficou se perguntando por que o homem olhava tanto para ele. Era como se não aprovasse não episcopais suando em sua igreja. Croyd trincou os dentes. Se pelo menos tivesse o poder de ficar invisível, pensou. Desapareceria por alguns minutos, se coçaria loucamente, depois reapareceria e se sentaria quieto.

Com grande força de vontade ele conseguiu se manter quieto durante a “Marcha” de Mendelssohn. Não conseguiu se concentrar no que o padre dizia depois disso, mas agora tinha certeza de que não conseguiria permanecer sentado durante a cerimônia inteira. Ele se perguntou o que aconteceria caso saísse imediatamente. Claudia ficaria constrangida? Por outro lado, tinha certeza de que se permanecesse ela ficaria. Ele devia estar parecendo doente o bastante para justificar. Ainda assim, seria um daqueles incidentes sobre os quais as pessoas passavam anos falando? (“O irmão dela saiu...”) Talvez pudesse ficar um pouco mais.

Houve movimento em suas costas. Ele sentiu o casaco se esticar. Ouviu engasgos femininos atrás de si. Estava com medo de se mover, mas...

A coceira se tornou insuportável. Ele descruzou as mãos para coçar, mas em um gesto final de resistência agarrou o encosto do banco à sua frente. Para seu horror, houve um barulho alto de estalo quando a madeira se partiu sob seu aperto.

Seguiu-se um longo momento de silêncio.

O padre estava olhando para ele. Claudia e Sam haviam se virado para olhar para ele, que estava sentado agarrando um pedaço de encosto de banco de um metro e oitenta e sabendo que não podia sequer sorrir, ou suas presas apareceriam.

Ele soltou a madeira e se agarrou com os dois braços. Houve exclamações atrás quando seu casaco escorregou. Ele enfiou os dedos nas laterais do corpo com toda a força e se coçou.

Ouviu as roupas se rasgando e sentiu a pele partir até o alto da cabeça. Viu a peruca cair à sua direita. Jogou as roupas fora e coçou novamente, com força. Ouviu um grito atrás e soube que nunca se esqueceria da expressão no rosto de Claudia quando começava a chorar, mas não podia mais parar. Não até que suas grandes asas de morcego se abrissem, as plumas altas e pontudas de suas orelhas se libertassem e os últimos restos de roupa e carne fossem removidos de seu corpo escuro e escamoso.

O padre recomeçou a falar, algo que soava como um exorcismo. Houve guinchos e barulho de passos rápidos. Sabia que não podia sair pela porta para onde todos se encaminhavam, então saltou no ar, circulou várias vezes para ter algum domínio dos novos membros, depois cobriu os olhos com o antebraço esquerdo e atravessou o vitral à sua direita.

Enquanto batia asas de volta a Manhattan, sentiu que se passaria um longo tempo antes que voltasse a ver os parentes. Esperava que Carl não se casasse tão cedo. Então se perguntou se um dia encontraria a garota certa...

Subiu, aproveitando uma corrente de ar ascendente, a brisa uivando ao seu redor. A igreja pareceu um formigueiro agitado quando olhou novamente. Ele saiu voando.